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SERVILIDADE JUDICIAL
Por Arthur Macedo
Norberto Bobbio afirma que a linguagem é empregada
também na luta política, “a arma da palavra”, sendo que
termos como ‘democracia’ e ‘ditadura’ são tão
frequentemente utilizados e desde muito tempo, que seu
emprego dá-se de maneira comum, e portanto, não-unívoco.
ensejada pelos inúmeros atos institucionais que alcançaram o
seu ápice em 13 de Dezembro de 1968.
Outrossim, a não apreciação pelo judiciário dos atos de
membros de quaisquer dos outros poderes fere de morte a
existência do Estado liberal em sua expressão mais
desenvolta, o Estado Democrático de Direito, relegando o país
ao autoritarismo, ao final da década de sessenta do século XX,
e “a sociedade a líderes que não enfrentam eleições abertas e
onde o fluxo de informações sofre controle político” – em
tradução livre da definição de autocracia, exprimida pelo
professor de política da Universidade de Cambridge, David
Runciman (p. XXII – Preface)[2]. Por conseguinte,
certamente que o ato institucional número cinco se sobrepôs à
Constituição vigente, porque é próprio do autoritarismo ver
confusão, desordem ou mesmo fatalismo de caos, quando há
uma multiplicidade de vozes em uma sociedade, ou pluralismo
dissonantes e convergentes de interesses que levam a
composição de um poder constituinte, de onde nascerá uma
Constituição Promulgada, quase como se a ordem natural,
divina, ou anterior aos homens, fosse calada pelas vozes
democráticas, tidas como “desagregadoras”. (BOBBIO, p.95)
“A linguagem política é notoriamente ambígua. A maior parte
dos termos usados […] têm significados diversos. Esta
variedade depende tanto do fato de muitos termos terem
passado por […] mutações históricas, […] como da
circunstância de não existir […] uma ciência política tão
rigorosa” para impor significados unívocos (BOBBIO,
p.1)[1].
O Autoritarismo, nessa esteira e sob analogia, pode e é muitas
vezes observado divergentemente nos contextos científicos,
da pesquisa acadêmica, indissociavelmente inseridos nas lutas
políticas de cada tempo, seja por ocasião da instituição do AI-
5 por exemplo, ou no momento que esse artigo crítico é
escrito. Por essa razão, Bobbio busca estabelecer o
“Dicionário de Política”, oferecendo uma explicação o mais
pacificada possível e simples dos conceitos que fazem parte
do repertório político, de onde a denotação “Autoritarismo”
será transposta e como método aqui utilizada.
De modo que, aí reside a justificação para o emprego do
golpe que fere a democracia, no hiato histórico ora sob crivo.
Contanto que, o autoritarismo seja aplicado em nome dessa
“ordem, segurança e tranquilidade”, proposto e dirigido pela
articulação e comando direto das forças armadas, que por suas
vezes, e nas palavras do estudioso Wanderley Guilherme dos
Santos (contemporâneo do AI-5 e autor que “premeditou” os
acontecimentos a partir de 1964), “significa alterar o jogo
político estabelecido pela minoria dirigente, [suas] regras e
leis”
apresentadas
ao
povo
para
submetê-los
permanentemente, como se sua força natural, preconcebida à
razão humana, as tornassem “imutáveis e intocáveis”[3]
(SANTOS, p. 13 – colchetes NOSSOS). Já que, o
autoritarismo era para ele um instrumento – “autoritarismo
instrumental” – de fomento do modelo de prosperidade
nacional do capitalismo, paradoxalmente do próprio
liberalismo, que poderia ter o seu curso econômico, pretendido
para o Brasil no contexto de guerra fria, afetado por uma
potencial ameaça dita comunista ou socialista. Significados
quase sempre, a despeito dos esforços de Bobbio, em
definições nebulosas, uma vez que seu emprego proposital,
Consoante o exposto, ademais, o substantivo ‘autoritarismo’,
derivado do adjetivo ‘autoritário’’, “é uma manifestação
degenerativa de autoridade” no qual os sistemas políticos
designados pelos regimes autoritários “privilegiam a
autoridade governamental e diminuem de forma mais ou
menos radical o consenso, concentrando o poder político nas
mãos de uma só pessoa ou de um só órgão e colocando em
posição secundária as instituições representativas” (BOBBIO,
p. 94). Por isso, outorgar poderes excepcionais ao chefe do
poder executivo, eximindo-o da responsabilização e revisão
do poder judiciário é o mesmo que desfazer a proposta feita
por Montesquieu da separação dos poderes, retirando da
espinha dorsal do poder do Estado “os freios e contrapesos”,
ou seja, é praticamente recriar o poder moderador de um
déspota esclarecido (ou um conjunto deles), mas não o poder
de “chave de cúpula” previsto por Constant, mas o “à moda
brasileira” do Império do Brasil, concebido por D. Pedro I e
sua Constituição de 1824, a primeira dessas paragens, que veio
a ser outorgada, assim como a que suplantou a de 1946,
31/03/2019
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