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Bilac. Em Registro, há uma boa amostra de seu valor literário.
Para o pesquisador da área de literatura, abre-se nesse volume outra possibilidade de pesquisa: o nacionalismo e o espírito patriótico de Bilac. Uma das vias desse campo de pesquisa seria acompanhar, no discurso do cronista, as comparações estabelecidas entre o Brasil e as demais nações, em discussões sobre a política internacional ou a simples análise de outras nacionalidades, como acontece no texto“ Civilização Norte-Americana”( 29.12.1904):
Aqui, no Brasil, quase todos acham que a América do Norte é o ideal de nação, um modelo de país, a flor suprema da Civilização Humana...
Santo Deus! Civilização não é só riqueza e força: civilização é, principalmente, justiça e bondade.(...)( p. 314)
Ainda sobre esse capítulo do nacionalismo no discurso de Bilac, mereceria sincera atenção“ Perigo estrangeiro”( 10.01.1905), em relação aos imigrantes alemães do Sul do país. E, claro, não podem ficar de fora dessa temática aquelas crônicas em que ovaciona figuras de relevo de nossa história, como“ José do Patrocínio”( 30.01.1905),“ Tiradentes”( 21.04.1906),“ Deodoro da Fonseca”( 16.10.1908).
O conteúdo nacionalista ou patriótico do cronista pode chegar às raias de discutir o lema da bandeira brasileira:
{...} Cosidas à faixa branca que retalha a esfera azul, aquelas letras obrigam a nossa bandeira a ter direito e avesso: e não há nada tão ridículo como possuir uma divisa, que, ao sabor do vento, ou ao acaso da posição em que se olha o pano, tanto pode ser Ordem e Progresso,- como ossergorP e medrO,- que parece língua de maluco.( p. 348)
Nesses dias de governo ilegítimo no Brasil, parece que nossa bandeira só tremula a contrapelo, pelo avesso, em contraposição a seu lema e no rumo do ossergorP e medrO. Mas, cabe lembrar que Bilac escreveu a letra do“ Hino à bandeira”. Coerente com essa crônica, o poeta não utiliza o lema da bandeira no hino.
Outro traço da composição de nossa identidade nacional revela-se em um bom conjunto de crônicas do poeta parnasiano: a língua portuguesa. Discute as mais diversas questões, entre elas a“ Reforma ortográfica”( 25.05.1905):“ É inegável que a barafunda, na maneira de grafar as palavras, é grande e deplorável. No Brasil( com s ou z?) ninguém se entende neste particular. Veja-se a imprensa diária... Nós, aqui, na Notícia, escrevemos registro; na Gazeta, escreve-se registo. {...}”( p. 339).
Ainda no que tange a aspectos da cultura nacional, inadequações de nossos costumes, em especial da classe da população aspirante aos padrões belle époque, podem ser lidas em“ Roupas claras e leves”( 14.11.1905):“ Oh! A sobrecasaca! Oh! A Cartola! Oh! Essa negra mortalha e essa fúnebre chaminé lustrosa, com que os‘ homens sérios’ desta terra afligem durante o verão o corpo e a cabeça, para afirmar e manter a sua seriedade!”( p. 367).
Por vezes, durante a leitura, somos tomados de espanto em crônicas como“ Comércio de escravos”( 1905), pelo simples motivo de Bilac mencionar que ainda havia, àquele tempo, no Brasil a escravização e o comércio de pessoas. Não custa lembrar que essa peste ainda não foi erradica do Brasil...
Em estudo sobre o ciclo da borracha na Amazônia, sabe-se das agruras por que passavam os seringueiros no Acre, transformando-se em verdadeiros escravos, como, nos dizeres de Euclides da Cunha, homens que trabalhavam para se escravizar. Contudo, parece que não é somente a esse fato histórico a que o cronista faz menção, a partir do que lê em um jornal. Merece destaque o seguinte excerto de“ Comércio de escravos”:
É um telegrama lacônico,- apenas duas linhas secas:“ Manaus, 15. – O prefeito do Acre publicou uma circular, proibindo o comércio de escravos!”.
Comércio de escravos! No Acre! No Brasil! Em 1905! – A coisa é tão inesperada, tão extravagante, tão monstruosa, que parece um gracejo de mau gosto, invenção satânica de algum espírito perverso. Mas, não! O caso é real! No Acre, vendem-se e compramse homens como mercadoria! Num ponto do Brasil, num trecho da grande pátria livre, há um mercado de carne humana! E é a primeira autoridade do lugar, é o prefeito quem reconhece o crime hediondo, proibindo, em circular oficial, o tráfico infamante!( p. 346)
Nessa mesma linha,“ Escravidão nos seringais”( 28.10.1908) apresenta a sina dos“ escravos da borracha” no início do século passado na Amazônia. Nessa crônica, Olavo Bilac noticia o uso de palmatórias nos seringais. E aqui Bilac está de braços dados com a denúncia feita por Euclides da Cunha sobre a situação desses trabalhadores naquelas plagas:
É uma chaga hedionda que se descobre. Ainda não há muito tempo, em artigos publicados no Jornal do
Comércio, Euclides da Cunha descreveu a miséria da condição dos seringueiros, engajados no seio das populações famintas do Norte, seduzidos com
{ voz da literatura } n. 2 | junho | 2018
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