Da comunhão dos vivos, vivo expulso.
Com a pupila hediondamente aberta,
tenta a cabeça erguer – baldado impulso.
Vai os braços abrir e mais se aperta.
Sente o mesquinho, o trágico despeito:
sete palmos de terra sobre o peito
e um caixão de seis tábuas por abrigo.
Alma, retém teu surto e teu lamento,
não tentes mais erguer-te ao firmamento,
dorme, enterrada viva em teu jazigo!
A paráfrase de Augusto de Lima só retém o tema rollinatiano da catalepsia,
que para o poeta francês seria um motivo de análise psicológica – uma busca pela
consciência; esse soneto fecha, entretanto, com uma reflexão filosófica do corpo
como ergástulo da alma, mais ao gosto romântico.
Talvez o poeta brasileiro que mais se aproximou da poesia de Rollinat, embora
não como tradutor, tenha sido Augusto dos Anjos. Além da terminologia que vai das
ciências biológicas às crenças populares (como "Noz-vômica”, “hipocondríaco”,
“funâmbulo”, “Quimera”) e o gosto por rimas inusitadas, a lírica psicológica é muito
próxima, como em "Psicologia de um vencido".
Embora sui generis, o tema da catalepsia é sintetizado por Augusto dos Anjos,
num soneto extraordinário, que nos faz pensar no poeta francês:
O CAIXÃO FANTÁTICO
Célere ia o caixão, e, nele, inclusas,
Cinzas, caixas cranianas, cartilagens
Oriundas, como os sonhos dos selvagens,
De aberratórias abstrações abstrusas!
Nesse caixão iam talvez as Musas,
Talvez meu Pai! Hoffmânnicas visagens
Enchiam meu encéfalo de imagens
As mais contraditórias e confusas!