audição).
E com quem minha mãe desabafava? Com sua filha, claro. No caso, eu. E estes medos todos foram me contaminando. Havia épocas em que se o telefone tocasse fora de hora, um pouco mais cedo pela manhã ou tarde da noite, eu já estremecia. Quando telefonava para minha mãe e sentia algo diferente em sua voz (mesmo que fosse apenas um resfriado), já vinha aquele medo de algo ruim ter acontecido. Era um misto de medo de perder a minha avó tão querida, e de ver o sofrimento de minha mãe. E mês após mês, ano após ano, a preocupação de minha mãe crescia e minha angustia e medo também.
Depois da fratura no fêmur, minha avó rapidamente voltou a andar, com apoio de uma bengala, e mais tarde de um andador. Apesar da falta da visão, ela vivia normalmente, cercada de familiares, e dentro das limitações da idade, com muita saúde. Ela nunca teve uma doença grave, nunca teve nenhum problema. Mas era pessimista, foi assim desde sempre. Ela dizia que não me veria casar, mas esteve em meu casamento. Dizia que não veria meus filhos, mas viu ambos. E dizia tantas outras coisas que perturbavam quem estava por perto – no caso, minha mãe.
Hoje, olhando para trás, eu sinto que minha família viveu um luto antecipado. Passamos longos anos com medo de algo acontecer à nossa matriarca, e acho que ela própria tinha este medo. Vivia com o terço na mão,
21