Revista Sesvesp Ed. 135 | Page 10

TRABALHO

* Francisco Gérson Marques de Lima, Doutor, Professor de Direito do Trabalho na UFC, Procurador Regional do Trabalho( MPT / CE)
sempre prevalecerão sobre as Convenções. O advérbio utilizado não é dos mais felizes, especialmente no campo do Direito, ciência que lida naturalmente com interpretações, por mais que se tente estabelecer limites hermenêuticos. O sempre é relativo. Portanto, a disposição legal vale como premissa, que, porém, pode excepcionalmente ser afastada em situações concretas, quando se perceba, por exemplo, que os Acordos tendam a inviabilizar ou neutralizar a CCT, ou retire direitos indisponíveis.
A Lei cria o princípio da intervenção mínima do Poder Judiciário nas negociações coletivas. De fato, prevê que os tribunais do trabalho evitem, ao máximo, interpretar os ACTs e CCTs, bem como não criem direitos além dos previstos no ordenamento. O propósito do legislador foi garantir a vontade das partes convenentes e promover segurança jurídica nos negócios coletivos. Apesar da ênfase à negociação coletiva, a lei não conseguiu impedir as anulações dos acordos e convenções coletivas, ficando em aberto os casos do art. 611-B, CLT, que não podem ser negociados, e os mencionados pelo Código Civil( arts. 104, 136, 145, 171 etc.), referentes a vícios de forma, de objeto, de capacidade negocial e de consentimento. A Lei 13.467 / 2017 se refere a“ elementos essenciais do negócio jurídico”, que podem ser apreciados pelos tribunais do trabalho.
A liberdade negocial há de ser compreendida dentro de um contexto maior, o do sistema jurídico, que possui preceitos constitucionais, princípios de direitos humanos e normas inderrogáveis, como são as referentes à saúde, higiene e segurança do trabalho. Portanto, as negociações coletivas não podem relegar tal normatividade maior, como é o direito à vida, aos repousos, às férias, aos descansos intra e interjornada, ao princípio da igualdade de tratamento( não discriminação). Mas podem negociar jornada, a forma dos repousos, padrões salariais, repartição de férias.
Consta do Código Civil que o princípio da boa-fé deve presidir os negócios jurídicos( art. 113). No âmbito das negociações coletivas, não é permitido, portanto, que uma parte leve a outra a erro; que preste informações inverídicas; que celebre acordos sem intenção de cumpri-los; que tenha um discurso na mesa, diferente do que faz fora dela; que prometa o que não pode cumprir; que negocie enquanto promove, na surdina, dissídios coletivos ou ações sindicais.
Outro ponto digno de registro é o equilíbrio negocial. O Direito do Trabalho abarcou, há tempos, o primado de que as negociações devem manter equilíbrio entre conquistas, deveres e obrigações. A Lei n º 13.467 / 2017 estabelece que“ a inexistência de expressa indicação de contrapartidas recíprocas em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho não ensejará sua nulidade por não caracterizar um vício do negócio jurídico.” A disposição legal não soterra o princípio já consagrado, pois toda negociação há de trazer vantagens mútuas, as quais, porém, podem não estar expressas no instrumento coletivo, por esquecimento, descuido ou conveniência das partes. Esta omissão textual não anula nem invalida a negociação, quando presente o equilíbrio negocial.
Sem dúvida alguma, a nova Lei ampliou os casos de negociação. Em se tratando de Direito Coletivo de Trabalho, a medida é genericamente boa, eis que possibilita os ajustes trabalhistas dentro da ambiência de determinado setor econômico e, mais, na própria empresa. A possibilidade de atender às peculiaridades e condições da empresa ajuda muito nestes momentos de aguda crise econômica. No entanto, tudo com prudência e na medida do que orientam os demais direitos que integram o sistema jurídico e as condições sociais dos trabalhadores. Afinal, negociar é, sobretudo, uma atividade de equilíbrio entre as partes.
Aguardemos, agora, o impacto real que a lei trará e a jurisprudência que será construída. ■
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