LiteraLivre n º 5 - Setembro de 2017
Luto
Susana Leonor Neves Campos Guarda – Portugal
Viver num sentimento de constante angustia em que o acordar por vezes é um suplício emocional . E no comer , a dor descansa por momentos , pela traição do conforto noutro local do corpo que não o coração . Arrastam-se os pés sem rumo nas percetivas de que o dia seguinte será melhor ou mais confortante , pela tua falta . Sinto-me como se ao puzzle do meu corpo faltassem algumas peças que me abandonaram ... de forma eterna . O meu corpo esse não se consegue suster sem essas peças vitais que me fazem viver , só posso a sobreviver . A morte essa palavra dura que faz perder tanto , insiste em se tornar presente todos os dias em mim . Pela falta da voz na entoação das palavras , as tuas palavras que se soltavam num riso contagiante . Como explico à tua filha que a abandonaste no momento que choraste pela primeira vez ? Sinto-me a querer fugir do que me faz lembrar de ti . Porque já nada faz sentido quando visito a tua casa . E , nessa altura não consigo aprisionar o meu sentimento mais profundo e as lágrimas soltam-se . Como explico às tuas filhas que choro por ti quando todos lhes pedem para não chorar ? Digo-lhes o quê nessa altura ? O que digo a mim ? Só sei escrever a dor em poesia que depois é esquecida em pastas dentro de pastas para que ali se aprisione e não volte a mim . As minhas alegrias e conquistas ficam a vaguear pelo meu pensamento porque já não sei qual a forma de contigo as partilhar .
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