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LiteraLivre nº 5
- Setembro de 2017
deitada de bruços na cama, só de calcinha. Era magra, uma falsa magra,
daquelas de ombros estreitos, cintura fina, mas os quadris largos, a bunda
achatada. Tinha a pele morena, cabelos louros mal pintados. Levantou a
cabeça do travesseiro, os olhos mu ito abertos.
O homem estava em pé, perto da cama. Ainda de calças, mas sem camisa.
Ia desabotoando a braguilha. Com o susto, deu um pinote, quase se amontoou
numa cadeira no meio do quarto. Voltou-se para nós. Era gordinho, meio
careca. Fui eu que o reconheci primeiro. Segurei o Pivica, que já ia partindo
para a agressão.
– Porra, Pivica, é o Doutor Célio!
Doutor Célio era um velho cliente nosso, político safado, pagava bem por
alguns servicinhos, nada de muito violento. Uns cascudos em adversários,
pequenas ameaças.
– É mesmo! – espantou-se o Pivica. Doutor Célio, o senhor por aqui – foi o
que ele encontrou para dizer.
Ele nos cumprimentou de modo um pouco arrogante como sempre fazia,
mesmo naquela situação esquisita. Já havia adivinhado o que viéramos fazer
ali. Quem está pagando pra vocês?
– Não pergunte isso, Doutor Célio. Não fica bem a gente entregar um cliente.
– Tá bem. Então quanto estão pagando? Eu cubro o valor.
O Pivica estava encrencado. O que fazer? Dar um pau no Doutor Célio? Nem
pensar. Por outra, certamente ele não gostaria de falar em valores na minha
frente. Eu nunca soube quanto na verdade ele recebia pelos nossos serviços.
Contentava-me com a minha parte.
Engasgou-se um pouco, franziu a testa, olhou para o chão em direção aos
seus tênis, e afinal chegou-se para perto do cliente e falou baixinho. O homem
disse: tá bom, me procure amanhã no escritório.
– E agora? Vamos dar o cano no cliente? – eu falei quando estávamos já fora
da casa.
– Foda-se. A vida é dos mais espertos. Trocar o Doutor Célio por um trouxa
qualquer é trocar doze por meia dúzia. Vamos dizer que o homem não
apareceu e desistir do negócio.
– Você é quem manda. Mas sabe o que me deu vontade ali no quarto?
– Nem imagino, mano.
– Dar um pau naquela vagabunda.
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