Revista LiteraLivre Revista LiteraLivre 5ª edição | Page 131

LiteraLivre nº 5 - Setembro de 2017 dois no flagra e dar um pau no sujeito. E mais não disse. O Pivica era assim, caladão, guardava os detalhes para ele, como se a posse deles lhe desse mais poder. Como se fosse um general montando as estratégias e mandando seus soldados cumprirem à risca suas ordens sem saberem para que porra de buraco estavam indo. Entramos no fusquinha 69 do Pivica, para-lamas pintados de fresco, e seguimos pela avenida até o bairro Itaum. Escoado o movimento do dia, as ruas estavam quase desertas. Após rodados uns 10 quilômetros, o Pivica estacionou o carro debaixo de uma árvore que coava a luz vinda dos postes. O calor me fazia o suor pingar das axilas. Saímos e andamos alguns metros. Nos postamos detrás de outra árvore na calçada e ficamos ali de campana. A casa que vigiávamos era baixa, de pintura descascada, guarnecida por um muro baixo, com portãozinho de madeira. Por trás de uma cortina simples brilhava uma luzinha fraca. Fiquei desconfiado. – É a esposa do cara, mesmo? Será que não é uma daquelas putas sustentadas pelo trouxa? – E daí? – respondeu ele. Eu não falei que era esposa do cara. Pra nós, basta completar o serviço e receber a grana. – Tá certo, brother. Bobagem minha. Já eram mais de 10 horas, estávamos na espera há uns vinte minutos e o Pivica não me adiantava mais nenhum detalhe. Quem viria? Como íamos entrar na casa para dar o flagra? Foi aí que parou uma caminhonete Honda, de cor indefinida, um pouco adiante da casinha. Um homem desceu do carro, apertou o controle, as luzes dos faróis deram uma piscada. Estava de chapéu com a aba abaixada. Veio se esgueirando como um gato, empurrou o portão, a porta da casa se abriu alguns centímetros e vupt!, entrou rápido. Esperamos mais uns quinze minutos, até que o Pivica falou: é agora! Passamos o portão, que abriu com um rangido fraco, quase imperceptível. O Pivica disse “me acompanha” e se dirigiu para a parte de trás da casa. Ali havia um diminuto espaço gramado até o muro traseiro, cheio de varais com roupas penduradas. Ao lado de um tanque de cimento, encostado na parede, estava uma porta fechada. Ali estava escuro. Pivica colocou a mão no bolso da calça e tirou uma chave. Riscou um fósforo, mas custou um pouco achar o buraco da fechadura. Enfim, nos esgueiramos para dentro da casinha. O interior era pequeno, bem simples, cozinha, banheiro, salinha com televisão e um quarto. No quarto havia luz. A porta, apenas encostada. Eu estava tenso. Mesmo que tivesse efetuado um trabalho desses todos os dias ainda assim ficaria nervoso. Era o temor do desconhecido. Dali a pouco estaria espancando uma pessoa que eu nunca havia visto antes. Que modo estranho de ganhar uns trocados. Nessas horas me dava um tremor nas pernas, uma vontade de largar o negócio, ir embora para a minha toca. Mas era a vida, se você se arriar nas cordas perde a luta, a vida passa. De súbito, o Pivica deu um empurrão na porta do quarto. A mulher estava 126