LiteraLivre n º 7 – janeiro de 2018
Carmen Jordão Pablo de Pão
Niterói / RJ
Carmen , com n . Fiz-me grande nas terras de outrem , porque no Brasil o sucesso só é aceito quando assinado pelo Tio Sam . Criaram uma imagem para mim que não era senão um batom exagerado , frutas na cabeça , saiote com babados e pulseiras múltiplas . Reboco grosso sobre minha alma melancólica . Meus demônios eram mais vociferantes do que a vontade deles de dar errado . Estiquei as mãos para os meus batutas , porque arte se faz junto , espontaneamente combinado .
Subíamos nos palcos com os sorrisos compartilhados de bons amigos . Eu era a excêntrica-meia pata-presença afirmada ; eles , os meus bons meninos , que envenenavam as melodias e recolocavam as minhas caras e bocas . Queria o sonho de muitos , o Brasil que explodia em alvorada no morro ou que se desenhava nas linhas do mar de Dorival . Ainda o sabor de seu camarão com chuchu , de um prato quentinho de sopa e a liberdade tão quista para cantar ...
Quando pisei em terras estadunidenses , não era uma estrela eterna , como hoje me querem . Cantei o nome do Brasil , coloquei suas vinte e sete estrelas no céu da Casa Branca . Sou dos tico-ticos , de sóis nunca nascentes na madrugada e dos bebês que estão a chorar , ciosos de mamar . Nunca me delimitei , porque sou artista e meus ornamentos não são mais do que minha expressão . Forjo sentimentos e sentidos , meu público me sente .
Ah , e tenha dó : esse lance de voltar americanizada é intriga da oposição . Sempre fui a Carmen das quatro paredes , que luta pelo sucesso coletivo nesses 40 de incontáveis mortes e desalentos . O mundo só é grande porque heróis colocaram um país , ainda que exótico , nas ondas do rádio e nas telas modernas . Escrevo possibilidades , encontro formas de fazer arte . Serpenteio minhas mãos e nada basta a esse quase continente que hoje me canta em mito . Um dia o Brasil aprenderá a prestigiar seus talentos antes que eles morram . De verdade .
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