Revista LiteraLivre 7ª edição | Page 120

LiteraLivre n º 7 – janeiro de 2018
todos, embora soubesse que me usavam com muita frequência. Não foi fácil, porém continuei a viver por longos anos, até que numa noite qualquer, eu, o Não, rapidamente, calado, sozinho e mudo, subi a ladeira mais alta da cidade. Daqui de cima, assisto o vai e vem de milhões de palavras criando inúmeras frases. Entro em êxtase, respiro fundo e me jogo! Desço rolando desembestado, em alta velocidade morro abaixo, feliz e gritando:- Nã ã ã ã ã ã ã o o o o oo o o......... É o fim!
*** Por ironia do destino, o senhor Não, foi atropelado pelo senhor Talvez, que a 200 km / h corria de Dona Certeza. No dia seguinte, o comunicado em todos os jornais!“ Faleceu ontem, na cidade das Frases, o senhor Não, que era solteiro e deixa os parentes: Talvez, Quiçá, Às Vezes, Quase, e também Dona Recusa”. Seu corpo será velado por todas as palavras do Dicionário.“ O sepultamento ocorrerá hoje às 17h no Cemitério dos Advérbios.” A partir de hoje, somente o Sim passa a existir, e ponto final. Sem o Sim Sim, Sim. Data de nascimento incerta. Filho do estrangeiro senhor Ok e da senhora Afirmativa. Papai queria que eu me chamasse Yes, mas fui batizado com o nome Sim e registrado em todas as nacionalidades. Amigos e parentes ficaram orgulhosos com a escolha desse nome, afinal o mundo precisava de um Sim, já que o senhor Não ainda existia e era assiduamente usado pelas pessoas. Sem envelhecer e sempre cheio de certezas, cresci perfeitamente como todas as outras palavras. Fiz parte de inúmeras ações positivas, e outras nem tanto assim. Admirava quando pronunciavam meu nome com fervor e paixão, finalizando os grandes acasos e os“ talvezes”. Sempre bem respeitado e tendo como fiéis amigos o Realmente, o Por Certo, o Seguramente, o De Fato, a Na Verdade, a Tá e até mesmo o Ahã e a Aham, vivíamos todos na mais perfeita aceitação. Porém, com o passar dos anos, sem muito perceber e sem saber bem o porquê, comecei a evitar a companhia desses amigos, passando a conviver mais tempo com o Provavelmente, o Talvez, o Quem Sabe, e até mesmo com o grande Não. Insatisfeitos com essas amizades, meus pais passaram a viver amuados,
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