LiteraLivre Vl. 4 - nº 19 – Jan./Fev. de 2020
Amélia Luz
Pirapetinga/MG
História de Vida – O Poder da Palavra
Nasci com o mundo no “front” e embora meus pais e avós fossem
proprietários de terras sofríamos economicamente as consequências drásticas da
2ª Guerra Mundial.
Na zona rural vivi minha infância e na minha casa não havia um livro sequer.
Minha irmã quatro anos mais velha que eu fora para a cidade aprender as
primeiras letras no grupo escolar. Sozinha, ficava no meu mundo esperando que
ela voltasse para compartilhar com ela do seu material escolar. Encontrei-me com
a sua primeira cartilha, a Cartilha do Povo, aquela que trazia na capa o desenho
de uma mão e em cada dedo uma das vogais descobrindo os primeiros símbolos
mágicos.
Mais tarde no segundo ano escolar ela ganhou um livro chamado Terra
Querida, decorei até o autor, Theobaldo Miranda Santos. Gostava dele e fingia ler
todas as lições. Ficava esperando ansiosa que ela chegasse da escola e trouxesse
para mim um pão doce salpicado de açúcar cristal, que eu chamava de pão-de-
açúcar e o livro, causa maior da minha ansiedade.
Quando ela chegava ia ajudar minha mãe nos afazeres domésticos e eu me
aproveitava disso para viajar na imaginação, com seu livro, é claro.
Fingia ler todas as histórias, quando chegava à última página, no compêndio
de Ciências Naturais havia o desenho do esqueleto humano que eu detestava por
representar a “caveira”, que representava a morte e me fazia tremer de medo de
assombrações.
Então, cada vez que folheava o livro levava um susto com a “caveira” e
acabei achando, ou julgando achar, uma solução para o caso. Fui escondida até o
fogão a lenha da minha mamãe e peguei um carvão e com ele rabisquei toda a
caveira. Pensei aliviada que agora eu poderia “ler” o livro à vontade sem deparar
com a apavorante “caveira”. Minha alegria durou até minha irmã descobrir o que
eu havia feito e depois disso minha mãe me repreendeu muito dizendo.
— Olha, menina, de hoje em diante você está proibida de por as mãos no
livro da sua irmã. Vou deixá-lo sempre em cima do guarda-roupa onde você não
o alcançará nunca! Foi uma tragédia para mim. Entristeci e na minha solidão eu
sentava no degrau e ficava desejando o livro tão sonhado, pensando:
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