Revista LiteraLivre 18ª edição | Page 22

LiteraLivre Vl. 3 - nº 18 – Nov./Dez. de 2019 Alessandra Cotting Baracho Maceió/AL A menina-borboleta “Como assim, Raquel?” A pergunta ecoava na cabeça da aniversariante. Era seu dia, mas não podia fazer, nele, o que quisesse. “Não quero festa!” A ideia martelando feito prego de ponta cega. “Não quero e pronto!” Os olhinhos da menina no seu décimo primeiro aniversário não revelam nada além de uma raiva sutil, como se uma névoa escondesse o que passava por detrás: a lembrança da mãe sempre cevando suas asas, lhe obrigando a crescer, crescer e voar. Suas asas quebraram, e a menina que vivia em outros mundos mergulhou no abismo que era o seu eu sem a borboleta-mãe. Era seu aniversário; sentada na pedra que adornava o quintal bem ao meio, Raquel puxava o ar com força, com raiva. “Como ela pôde me deixar?” E enquanto respirava fundo a raiva foi se desmanchando, se misturando ao cheiro do bolo que a avó preparava na cozinha. Não queria a festa, a mãe não estaria lá, nunca mais. “Raquel, é seu aniversário, vamos comemorar!” disse a avó toda animada no dia anterior. “Não, não quero, só quando eu virar estrela também.” A avó com a mão na cabeça não sabia o que fazer, a menina-borboleta pousava com as asas caídas, triste sem o porto; mas a avó não se deu por vencida, se não queria a festa, faria ao menos o bolo com calda e enfeitado com as jujubas que a neta amava, assim como a mãe também. Espiando na soleira da porta, Raquel observava os movimentos da avó que andava feito uma barata tonta em frente a forma e esticou o pescoço pra ver seu doce preferido; no fogão, a cobertura fumegava e ela se pegou lembrando do gosto doce do chocolate e da lágrima que caia do olho da mãe em todo dia de [19]