LiteraLivre Vl. 3 - nº 17 – Set./Out. de 2019
por piedade, retire a lâmina do chão,
não vês que assim me faz sofrer? Vem
abraçar-me, posso dar-lhe o poder, a
eterna juventude, baús de ouro e
prata... – Nada porém me interessava,
no entanto, a não ser salvar a minha
vida e libertar-me daquele pesadelo.
Nem o poder nem a riqueza podiam
seduzir-me. Eu não queria negociar com
a bruxa má, estando com medo de
perder a alma e a razão”.
José
ficava
desesperadamente
agarrado à faca, ainda, agachado,
aterrorizado, os olhos fechados, para
não ver a criatura vil que se contorcia
em torno dele, gritando com fúria, com
gritos horríveis, como assobios de
víboras. Rogando-lhe para retirar a
lâmina do chão, porque a fazia sofrer. O
menino encontrou a força para resistir.
A luta foi longa, mas, após o que
pareceu um prazo de tempo eterno, já
não sentia sua respiração no meu
pescoço, nem os seus gritos de raiva.
Tremendo de medo, abri os olhos e olhei
em volta. Eu vi em direção ao rio a
silhueta da bruxa na corrida, como uma
nuvem
fantasmagórica,
até
ela
desaparecer entre as árvores. Fiquei
ajoelhado, com as mãos agarrando a
minha adaga. Quando encontrei a
coragem de levantar-me, as árvores
estavam imóveis e em silêncio, a lua e
as estrelas brilhavam, como se nada
tivesse acontecido. Apressei-me a deixar
o lugar amaldiçoado, que ainda parecia
impregnado com a presença do diabo.
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Eu queria ver outros homens, a luz, a
vida...”
Naquela noite, o jovem José
conseguiu escapar da Dona das águas
e voltou para casa, mas ele nunca
mais foi o mesmo. Ele já não sabia
como separar seus pensamentos da
bela mulher, a quem havia recusado
seu favor. Além disso, aquela pessoa
lembrava-lhe a amiga desaparecida.
Tornou-se apático e desatento. Triste,
silencioso,
evitava
os
amigos,
conduzia as próprias empresas longe
da família. Logo depois, a região foi
atingida por uma seca prolongada. A
chuva caía cada vez mais rara e
escassa. As águas do rio corriam
mais lentas e o nível delas caíra mais
baixo. Emergiam ilhas de areia de
grandes dimensões. A vegetação
estava perecendo. Os animais que se
aproximavam aos bancos para beber
faziam com seus cascos uma pasta
lamacenta que se solidificava depois,
criando mil crateras.
O dia veio em que o rio parou.
Pela primeira vez na memória dos
homens daquele país, a seca e a
evaporação haviam derrotado as
forças da vida. A aldeia inteira
murmurou atrás de José, que se
atrevera a rejeitar a Senhora das
águas. A agonia do rio parecia ser
uma maldição, conseqüência da
recusa dele, que tinha roubado as
energias vitais ao gênio da corrente.
As repercussões podiam cair sobre
toda a comunidade. Os anciãos da