LiteraLivre Vl. 3 - nº 16 – Jul./Ago. de 2019
A viagem do grãozinho de areia
Alberto Arecchi
Pavia – Itália
Antes do que o ar for criado, o céu era preto e a luz era dura, sem
esfumaduras. Tudo era silêncio, as árvores ficariam firmes... Na verdade, se
querermos expressar toda a verdade, nem havia árvores ou animais. Só uma
paisagem fantasmagórica, feita de montanhas ásperas e vulcões. As rochas - que
pareciam cortadas com um machado - ressaltavam como silhuetas contra um céu
sempre preto. Os rios corriam impetuosos, negros como tinta, refletindo o céu.
Um dia, do nada, uma pequena esfera transparente começou a inchar, como uma
bolha de sabão, tornou-se cada vez mais gigantesca, e em seguida abriu-se e
lançou o vento. Foi como um sopro de liberdade... O azul explodiu no céu e as
águas reverberavam-no com mil tonalidades. Finalmente, a vida das plantas e
dos animais podia começar, as árvores podiam roçar, alguém poderia ouvir o
barulho do vento e das pedras caindo. O que tinha acontecido? Um elfo, livre de
herança e riqueza, implorou ao Criador para dar-lhe um sopro de vento, algo que
não custaria nada, apenas um sopro, e foi assim que houve o ar. Como todos
sabem, a respiração e a palavra não custam nada, mas são o mais que exista de
vital. As cores se mexiam num arco-íris iridescente com reflexões e
transparências evanescentes, como as asas de uma libélula enorme. O mesmo
elfo que tinha aplicado para se tornar "mestre do vento", olhando no seu rosto
reflexo em uma poça de água, descobriu as próprias sombras e esfumaduras...
Detalhes que faltavam até um momento antes, quando seu rosto parecia uma
meia-lua, meio claro e meio completamente preto.
Até aquele tempo, não havia pássaros nem outros seres voadores, até mesmo
faltavam todos os animais que respiram. Também faltavam as plantas, que
precisam de ar para viver. Portanto, em toda a Terra, apenas os elfos e os cristais
foram testemunhas do evento maravilhoso. Os elfos contam isto em suas
tradições, que permanecem gravadas em uma veia de ouro puro, como em um
livro secreto, na parede mais escondida, na caverna mais profunda de todo o
planeta. Esta página de sua história não tem título "O nascimento do ar", mas
começa com a frase: "No dia em que se viu o primeiro arco-íris". Os elfos, de
fato, não precisam de ar para respirar, mas ficaram tão impressionados com a
grande explosão das cores, como em uma bolha de sabão iridescente, ricas de
tons e matizes, nunca vistas antes, que marcaram a data, desde então e para
sempre, como "tempo zero" de seu calendário.
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