LiteraLivre Vl. 3 - nº 14 – Mar./Abr. de 2019
falem de toxicodependentes, esperando, a cada momento, reconhecer o filho
num desses desgraçados que neles aparecem.
Mas hoje é dia de festa. E quer que seja uma festa bonita para os seus
netinhos e para todos os seus entes queridos. Tem de mostrar-se alegre.
Ninguém pode aperceber-se da tristeza que lhe corrói a alma, da dor que faz
sangrar o seu coração de mãe, onde existe, ainda que vaga, a esperança de que
ele, o seu filho, apareça, e possa apertá-lo em seus braços.
Em cada quadra natalícia que passa, espera esse milagre.
Sabe o quanto Carlos gostava do Natal. Em cada Natal renasce a esperança de
vê-lo chegar.
- Vó, Vó, tago uma penda bonita pa ti. A mamã compou.
É Cláudia, a netinha mais nova que acaba de entrar. Ainda não tem três anos.
- Oh! Minha querida, já chegaste? Dá cá um beijo muito grande à vovó.
Então trazes uma prenda para mim? Que bom! Que bom! Vou receber uma
prenda da minha Princesa adorada! - E pegando-lhe ao colo, abraça-a e recebe o
seu beijo e o seu abraço carinhosos.
A casa começa a encher-se de risos e gritos.
Os netos, três rapazes e duas meninas, já estão todos, e não param quietos,
nem calados. Mas Teresa gosta de vê-los assim. Gosta dessa alegria, dessa
traquinice saudável, que lhe lembra o tempo em que ela, neta, chegava com os
irmãos e com os pais à quinta dos avós, em Trás-os-Montes, onde se juntavam
com os tios e primos para passarem a Noite de Consoada e o Dia de Natal.
A noite vai decorrendo entre os risos e as diabruras das crianças e a conversa
mais ou menos animada dos adultos, que não falam do ausente, mas está
presente no pensamento de todos.
Chega a meia-noite e saem para a Missa do Galo. Vão todos. Até Cláudia!
Não houve maneira de fazê-la adormecer; também quer ir “ver o Jesus”.
No fim da missa regressam a casa. As crianças mais velhas falam sem cessar.
Estão excitadíssimas. Não querem ainda ir para a cama. Não têm sono e não há
quem as convença a deitarem-se.
-Meninos!... Então? Vamos todos, todos, rapidamente para a caminha, se
querem ter prendas! O Pai Natal, com a luz acesa, não vem trazê-las. Enquanto
vir luz, não aparece – disse Teresa.
Palavras sábias! Todos se apressaram a ir para a cama para apagarem as
luzes. É importante que o Pai Natal chegue e fique à vontade para deixar as
prendas junto à Árvore de Natal.
A casa ficou finalmente em silêncio e às escuras; mas a Teresa não dorme.
Não consegue adormecer. Está inquieta. O tempo passa e o filho ausente não lhe
sai do pensamento: “Onde estará? Terá comido alguma coisa? Terá uma cama
para dormir?
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