LiteraLivre Vl. 3 - nº 14 – Mar./Abr. de 2019
A Guerra da Líria
Joaquim Bispo
Odivelas, Portugal
Arrebatamentos de potência e invencibilidade dominavam a mente de Jorge
Fontoura naquela manhã. O negócio com os investidores imobiliários chineses
tinha sido concluído. Agora, havia que pôr a gorda e saborosa comissão a
trabalhar. O seu gestor de conta, que já em outras ocasiões o tinha incitado a
apostar em aplicações financeiras agressivas, recebeu-o de imediato:
— Tenho justamente o que lhe vai agradar, senhor Fontoura — atacou o
gestor. — Já ouviu falar em SEP? São produtos de exposição suprema, na sigla
em inglês. Não lhe vou mentir; como o nome sugere, são aplicações de risco
máximo, em que o investidor pode perder tudo de um dia para o outro, mas, se
correr bem, como quase sempre sucede, o senhor Fontoura pode ver triplicado
ou quintuplicado o seu investimento em um ano, ou até em poucos dias. Quem
não arrisca não petisca, lá diz o ditado.
— Ótimo; mas de que se trata: ações, futuros, o quê?
— Uma espécie de ações. Ou antes, unidades de conquista e predação,
como eu gosto de lhes chamar. Cada ação é como um soldado que invade o
território inimigo, mata quantos encontra e regressa com os despojos. Ou então
mantém-se a ocupar o território, a assegurar um fluxo contínuo de riqueza para
os acionistas. Para o seu bolso, senhor Fontoura.
— Não estou a entender nada. Já percebi que são aplicações agressivas,
mas apresentá-las como soldados a invadir território inimigo será uma metáfora
exagerada, não?
— De modo algum! É mesmo disso que se trata. O que lhe proponho,
senhor Fontoura, são ações da Guerra da Líria. Sim, aquela que começou há
quinze dias — reforçava o gestor bancário, perante o rosto incrédulo de Fontoura.
— É o produto que está a bombar. Aproveite agora, enquanto estão baratas,
porque quando o conflito ganhar dimensão, quando, como se espera, os rebeldes
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