Revista LiteraLivre 13ª edição | Page 85

LiteraLivre Vl. 3 - nº 13 – Jan/Fev. de 2019 – Eu passei ontem de carro por aqui e vi a senhora. Faz tempo que não tínhamos notícias suas. Perdoe-me, mas agora eu preciso ir. Só queria ver se estava bem. A moça se levantou aflita. O momento parecia incomodá-la também: – Até breve – disse enquanto se afastava da velha sentada. Ela olhou para a garrafa e a apertou, como se sentisse uma forte contração. – Como ele está? A moça parou e deu um sorriso, que foi rapidamente consumido pela dor que a lembrança parecia trazer. – Ontem ele disse a primeira palavra. Ele falou “mãe”. A velha sorriu enquanto seus olhos lacrimejavam. – Ele é esperto como o pai era. – É sim – respondeu a moça, também emocionada com a conversa. – Eu realmente preciso ir. – Eu entendo. Não se preocupe. Obrigada! – Se precisar... – Não. Não se preocupe. Estou bem. Sério! A moça ainda tentou esconder a preocupação enquanto saía. A realidade é que as duas tentavam demonstrar superficialidade. A velha a assistiu partir e fuçou a sacola. Encontrou um agasalho, que vestiu no mesmo instante. Mais no fundo da sacola achou uma foto de um bebê, na qual ficou minutos parada, olhando. Após isso, deitou-se e dormiu agarrada à garrafa. Ninguém sabe ao certo o que sonhava. Era apenas ela, vivendo sua própria vida solitária em um universo no qual era hóspede indesejada. 81