LiteraLivre Vl. 2 - nº 12 – Nov./Dez. de 2018
Janela do Tempo
Waldir Capucci
Jacareí/SP
Os escombros da velha casa escondem tesouros do meu passado. Foi lá
que morou por décadas a minha tia mais velha e, também, onde a família se
reunia. Impossível esquecer tantos aniversários, casamentos e a tradicional
passagem de ano, quando todos se esforçavam para comparecer, mesmo os
moradores de cidades distantes.
Viajo no tempo e consigo ver o rosto de cada um dos meus tios e primos,
tal como eram em cada época. Alguns já não estão mais conosco, e destes a
saudade é ainda maior, e fico a imaginar como seriam hoje as suas aparências.
Olho para os tijolos, telhas, pedaços de madeiras e ferros esparramados no
terreno vazio. Estão todos impregnados com marcas indeléveis, histórias que o
tempo não apaga. Jamais irá apagar também as minhas lembranças do imenso
quintal, foram quatro gerações que puderam desfrutar daquele espaço com sua
variedade de árvores frutíferas, cada qual com um dono.
A pitangueira, talvez a menor de todas as espécies do local era minha, e eu
sequer alcançava seu topo, pedia ajuda pra colher os tantos frutos que ela
produzia. Quantas vezes, sentado sob seus galhos e recostado no seu tronco,
ficava imaginando como eu seria quando adulto. Impensável tentar computar o
montante de horas consumidas em conversas minhas com aquela árvore, fiel
amiga, e a quem confidenciei tantos segredos e sonhos infantis.
Anos mais tarde, já na minha adolescência, foi publicado o livro “O Meu Pé
de Laranja Lima”, no qual José Mauro de Vasconcelos, autor, relatava fatos
parecidos, e pude compreender mais que qualquer outro leitor a dor do pequeno
Zezé, personagem central da história.
Hoje, já sexagenário, e quase cinco décadas do lançamento da primeira
edição, asseguro que minha dor é muito maior que a dele. Criança supera as
88