Revista LiteraLivre 12ª edição | Page 94

LiteraLivre Vl. 2 - nº 12 – Nov./Dez. de 2018 Janela do Tempo Waldir Capucci Jacareí/SP Os escombros da velha casa escondem tesouros do meu passado. Foi lá que morou por décadas a minha tia mais velha e, também, onde a família se reunia. Impossível esquecer tantos aniversários, casamentos e a tradicional passagem de ano, quando todos se esforçavam para comparecer, mesmo os moradores de cidades distantes. Viajo no tempo e consigo ver o rosto de cada um dos meus tios e primos, tal como eram em cada época. Alguns já não estão mais conosco, e destes a saudade é ainda maior, e fico a imaginar como seriam hoje as suas aparências. Olho para os tijolos, telhas, pedaços de madeiras e ferros esparramados no terreno vazio. Estão todos impregnados com marcas indeléveis, histórias que o tempo não apaga. Jamais irá apagar também as minhas lembranças do imenso quintal, foram quatro gerações que puderam desfrutar daquele espaço com sua variedade de árvores frutíferas, cada qual com um dono. A pitangueira, talvez a menor de todas as espécies do local era minha, e eu sequer alcançava seu topo, pedia ajuda pra colher os tantos frutos que ela produzia. Quantas vezes, sentado sob seus galhos e recostado no seu tronco, ficava imaginando como eu seria quando adulto. Impensável tentar computar o montante de horas consumidas em conversas minhas com aquela árvore, fiel amiga, e a quem confidenciei tantos segredos e sonhos infantis. Anos mais tarde, já na minha adolescência, foi publicado o livro “O Meu Pé de Laranja Lima”, no qual José Mauro de Vasconcelos, autor, relatava fatos parecidos, e pude compreender mais que qualquer outro leitor a dor do pequeno Zezé, personagem central da história. Hoje, já sexagenário, e quase cinco décadas do lançamento da primeira edição, asseguro que minha dor é muito maior que a dele. Criança supera as 88