Revista LiteraLivre 12ª edição | Page 157

LiteraLivre Vl. 2 - nº 12 – Nov./Dez. de 2018 você adora. Como assim? Desde quando homem ajuda mulher na cozinha e ainda a manda descansar? Hoje mesmo meu namorado me mandou arrumar algum emprego na parte da tarde, alegando que ao invés de estudar, eu ficava o dia inteiro a toa. Esse casalzinho só podia estar de brincadeira comigo, fazendo encenações para me atingir. Deviam imaginar que eu tenho horror a quem vive a vida como se não existissem problemas ou sofrimento. Jogo o caderno na mesa e desisto de estudar. Ligo a TV pra ver se pelo menos assim não ouço as sandices desses meus vizinhos asquerosos. Vejo noticiários com as seguintes chamadas: “Marido mata a mulher depois de flagrá- la na cama com outro”, “Mulher esfaqueia namorado por ele ter se atrasado 30 minutos para chegar em casa” e penso: Essa é a realidade em que vivemos, o resto é ilusão e percebo que não teve nada de errado ou anormal quando joguei o celular na cara do meu namorado por ele ter se recusado a me deixar ler suas mensagens. Anormais são meus vizinhos, que ficam fingindo ser o casal perfeito. Decerto quando um deles saía de casa sozinho ia se encontrar com o amante. Desligo a TV e tento dormir, quando sou obrigada a ouvir , novamente, as palavras melosas de ambos e, consequentemente, imaginar o que eles poderiam estar fazendo. Como podiam ser tão ridículos? Tudo deveria ser tão monótono, não se ouvia um xingamento sequer, um barulho que indicasse um pouco de vivacidade entre o relacionamento deles, uma palavra que demonstrasse euforia. No outro dia, levantei cedo, e ao passar pela porta da casa deles, já que morávamos no mesmo terreno, me deparo novamente com mais uma cena que me enojava: — Amorzinho, o café tá na mesa. Fiz os ovos mexidos que você gosta. — Obrigada, anjinho. Já estou indo. O marido aproxima-se, senta-se ao lado da esposa e, bem juntinhos, começam a tomar café. Nem para tomar café eles poderiam desgrudar-se um pouco? Devido a um problema com um cliente, atrasei-me na saída do trabalho e, quando cheguei em casa, já estava meu namorado na porta, gritando, aos berros, que eu devia estar com outro, que se pensava que ele era burro, estava muito enganada, que aquilo não iria ficar assim, uma hora ele ainda me pegaria no flagra. Depois de muitos insultos, de ambas as partes, mandei-o ir embora e entrei. Ainda bem que o casal chiclete ainda não tinha chegado em casa e pude ter paz para pensar na vida, no meu relacionamento que, apesar das turbulências, era um namoro real, sem hipocrisia. Tentei estudar um pouco, à tarde, mas meus pensamentos interrompiam 151