Revista de Medicina Desportiva Nov. 2021 | Page 12

Tema 1

Rev . Medicina Desportiva informa , 2021 ; 12 ( 6 ): 10-12 . https :// doi . org / 10.23911 / Biomecan _ boxe _ 2021 _ nov

Biomecânica e Traumatologia do Boxe

Ft . Pedro Martins Farinha 1 , Dr . Diogo Lino Moura 2
1
Aluno do Mestrado Integrado em Medicina na Faculdade Medicina da Universidade de Coimbra ( FMUC ), Fisioterapeuta ; 2 Docente da FMUC , Assistente Hospitalar do Serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra .
RESUMO / ABSTRACT
O boxe amador praticado nos Jogos Olímpicos tem progredido nas condições de segurança para os seus praticantes . As lesões mais comuns são feridas e lacerações na cabeça , concussões cerebrais e fraturas . O boxe profissional , contudo , não tem acompanhado esta tendência de revisão de regras e promoção de maior segurança , ocorrendo frequentemente lesões graves , nomeadamente as lesões na cabeça e do pescoço . O conhecimento da epidemiologia e biomecânica das lesões no boxe poderá permitir aos atletas e treinadores antecipar a ocorrência de lesões e adotar estratégias de prevenção eficazes .
Amateur boxing practiced at the Olympic Games has been evolving in conditions of safety for its athletes . The most common injuries are head wounds and lacerations , brain concussions and fractures . However , professional boxing has not kept up with this trend of revising rules and promoting greater safety , turning their athletes prone to severe injuries , especially head and neck injuries . The knowledge of epidemiology and biomechanics of boxing injuries may allow athletes and coaches to anticipate injuries and adopt effective prevention strategies .
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Boxe , biomecânica do boxe , lesão do membro superior , lesão da cabeça e pescoço , estratégias preventivas . Boxing , boxing biomechanics , upper extremity injuries , head and neck injuries , prevention strategies
Origem e enquadramento no boxe
Os primeiros registos da prática de boxe datam de 3000 a . C ., no Egito , sendo que rapidamente se tornou num dos pilares dos Jogos Olímpicos da antiguidade na Grécia . A primeira aparição como desporto ocorreu na 23 ª Olimpíada 23 em 688 a . C . 1 Desde então , a forma original do desporto tem vindo a ser aprimorada , fundamentalmente através de medidas que conferem maior segurança aos atletas . 2
No boxe os pugilistas lutam num ringue elevado , com um piso de lona em borracha , num quadrado com 6,1 x 6,1 metros2 e os lados são marcados por quatro linhas de cordas . 3 Existem dois cantos , um para cada adversário , azul e vermelho , onde se pode descansar entre rondas , sendo que os pugilistas vestem equipamento da cor correspondente . Os assaltos têm quatro rondas de dois minutos cada , com um intervalo de um minuto entre estes . No final , o pugilista com o maior número de pontos acumulados é considerado vencedor , mas a vitória também poderá ser declarada através de knockout . No entanto , se os árbitros ou a equipa médica considerarem que a saúde dos atletas está em risco , eles podem pôr fim ao assalto em qualquer momento , como também o treinador poderá “ atirar a toalha ao chão ” e terminar o assalto , o designado knockout técnico . Os assaltos poderão ainda terminar se a diferença de pontuação entre dois pugilistas exceder os 15 pontos . Os pugilistas apenas podem atingir o adversário com as luvas , não sendo permitido usar os cotovelos , os membros inferiores ou a cabeça . Os golpes só podem atingir a parte corporal acima da cintura , sendo proibido golpear a região lombar ( rins ) ou a região posterior da cabeça . O árbitro deverá advertir o pugilista para estas faltas e três advertências levam à desqualificação ( figura 1 ). 3 Devido à elevada frequência de lesões neste desporto , a Amateur International Boxing Association ( AIBA ) procedeu a alteração de algumas regras em 2013 que incluem , por exemplo , o aumento do tamanho das luvas e alterações no sistema de pontuação . 2 Neste sentido , o boxe amador , aquele praticado nos Jogos Olímpicos , tem
vindo a progredir nas condições de segurança para os seus praticantes . 4 Ainda assim , o boxe profissional não tem acompanhado esta tendência de revisão de regras e promoção de maior segurança , ocorrendo frequentes knockouts e lesões potencialmente graves . 5 , 6 O conhecimento da epidemiologia e biomecânica das lesões no boxe poderá permitir aos atletas e treinadores antecipar a ocorrência de lesões e adotar estratégias de prevenção eficazes .
Traumatologia desportiva no Boxe
Frequência e tipos de lesão Zazryn et al . avaliaram 907 assaltos em 545 pugilistas profissionais durante oito anos e meio e verificaram ocorrência de 214 lesões em 177 assaltos ( 19,5 % dos assaltos ), com frequência de lesão de 23,6 por cada 100 assaltos . 7 A frequência de lesão tende ainda a ser superior em combates terminados por knockout ou knockout técnico . 7
As lesões mais comuns registadas foram as feridas e lacerações na cabeça ( 61,7 %), concussão cerebral ( 11,7 %) e fraturas ( 8,4 %). Os autores verificaram ainda uma morte devido a complicações decorrentes de uma hemorragia subdural na região frontoparietal esquerda . 7 Num estudo retrospetivo realizado entre 2000-2012 , baseado em combates de atletas profissionais , verificou-se a ocorrência de lesão em 277 dos 550 combates ( 50,4 %), sendo que as lesões mais comuns foram contusões ( 44 %), concussões cerebrais ( 10 %) e lacerações ( 9 %). 8 Baird et al . verificaram ocorrência de 120 mortes em combates profissionais de boxe entre 1983 e 2007 , confirmando a elevada frequência deste evento catastrófico . 9 Os eventos fatais ocorrem mais frequentemente após fortes golpes na cabeça
Figura 1 – Boxe amador , o tipo de boxe praticado nos Jogos Olímpicos
10 novembro 2021 www . revdesportiva . pt