Revista de Medicina Desportiva Informa Setembro 2018 | Page 6

O que andamos a ler

Nesta rúbrica pretendemos dar notícia de artigos recentes ou que merecem ser ( re ) lidos e comentados . Será uma página aberta a todos os colegas que pretendam colaborar descrevendo ou comentando temas de medicina desportiva .
Rev . Med . Desp . informa , 2018 ; 9 ( 5 ): 4-6 . https :// doi . org / 10.23911 / Comentario _ Faculdade _ de _ Medicinado _ Porto
Dra . Ana Luísa Santos , Prof . Doutor Guilherme Macedo Faculdade de Medicina do Porto .
Guidelines for the prevention and treatment of travelers ’ diarrhea : a graded expert panel report 1
A prevenção e tratamento da diarreia do viajante : o que dizem os entendidos ?
A diarreia do viajante ( DV ) constitui , cada vez mais , um problema à escala mundial , com repercussões conhecidas a nível individual e de saúde pública . Apesar das inúmeras publicações acerca do tema , este artigo , fundamentando-se na opinião de um painel de experts , concentra e renova um conjunto crucial de recomendações práticas , em termos de prevenção e tratamento da DV , essenciais para todos os profissionais que lidam diariamente com esta problemática .
Uma das grandes revoluções apresentada neste artigo prende-se com a classificação da severidade da DV de acordo com o impacto funcional da doença no indivíduo , ao invés da sua classificação de acordo com o número / frequência das dejeções . Assim , esta doença pode definir-se como aguda ou persistente ( se tiver duração superior a duas semanas ), classificando-se , de acordo com o impacto funcional , em ligeira , quando tolerável e sem impacto nas atividades planeadas , moderada , quando causadora de angústia e com implicação nos planos da viagem , ou severa , quando
incapacitante . Todos os casos de disenteria ( que implica a presença de diarreia sanguinolenta ) são considerados severos .
Embora estudos recentes sugiram eficácia da profilaxia antibiótica desta entidade , não existem dados suficientemente fortes que remetam para a sua recomendação à escala global , mais ainda quando a resistência aos antibióticos , com o aparecimento crescente de estirpes microbianas multirresistentes , se apresenta como um problema da sociedade atual . Assim , este grupo de entendidos considera que a profilaxia antibiótica da DV deve ser reservada para indivíduos com elevado risco de complicações posteriores à doença , nomeadamente aqueles com história prévia de morbilidade a longo-prazo após um episódio de DV ou com patologia crónica que poderá predispor a estas consequências . Nestes casos deve usar-se rifaximina , sendo as fluoroquinolonas contraindicadas . A profilaxia ( não antibiótica ) com subsalicilato de bismuto pode ser considerada em qualquer viajante ( embora não exista venda isolada em Portugal ).
Em relação ao tratamento , e no momento do aparecimento dos sintomas , é essencial que o viajante tenha , pela informação previamente concebida , consciencialização da gravidade / severidade da doença , com vista à toma , de forma autónoma , da terapêutica adequada . No caso da DV ligeira são recomendadas medidas sintomáticas , com reforço da hidratação ( água e / ou soluções salinas de hidratação oral ) e antidiarreicos , como a loperamida ; a toma desta deve ser iniciada com 2 comprimidos ( 4 mg ), com reforço de 1 comprimido a cada dejeção ( totalizando um máximo de 16 mg / dia ). Quando a DV é moderada , quer os antidiarreicos ( como a loperamida ), quer os antibióticos podem ser utilizados , isoladamente ou em associação , de acordo com a sintomatologia . No que concerne à antibioterapia , a evidência remete para três opções igualmente válidas : fluoroquinolonas ( levofloxacina , ciprofloxacina , ofloxacina ), azitromicina e rifaximina . Apesar da sua eficácia comprovada , as opiniões relativas às fluoroquinolonas começam a ser discordantes , dado o perfil de efeitos adversos ( nomeadamente musculoesqueléticos ), a emergência das resistências antibióticas e os efeitos em termos de disbiose intestinal . A rifaximina , pela sua pobre absorção , é uma opção facilmente tolerada ; contudo , a sua utilização empírica deve ser cuidada ( ou mesmo evitada ) em áreas de maior prevalência de microorganismos entéricos invasivos ( como Campylobacter , Salmonella e Shigella ). Dada a sua ação mais rápida em termos de alívio sintomático , a loperamida é um ótimo adjuvante da terapêutica antibiótica . Pode ser utilizada isoladamente em alguns casos de DV moderada , sendo contraindicada em crianças com menos de dois anos de idade . No que respeita à DV severa , a terapêutica antibiótica deve ser sempre utilizada . A azitromicina deve ser considerada como primeira opção nos casos de disenteria , bem como perante diarreia aguda aquosa com febre moderada / elevada , o que sugere maior probabilidade de infeção por microorganismos resistentes às fluoroquinolonas ( Campylobacter ) e outras bactérias enteréricas , como E . coli enteroinvasiva , Aeromonas spp . e yersinia enterocolítica ; adicionalmente , deve também ser o fármaco preferido nos viajantes do sudeste asiático , pela maior resistência as fluoroquinolonas . Nos casos de diarreia aquosa não invasiva , para além da azitromicina , as fluoroquinolonas e a rifaximina são opções igualmente recomendadas , acabando os doentes por preterir a rifaximina por implicar mais do que uma toma
4 setembro 2018 www . revdesportiva . pt