Revista de Medicina Desportiva Informa Março 2018 | Page 13

consulta para realização de exame médico-desportivo pela primeira vez, no sentido de passar a praticar desporto federado. Não apresentava queixas e negava antecedentes pes- soais ou familiares relevantes. O ECG em repouso (Figura 2) mostrava ritmo sinusal com 79 bati- mentos por minuto, com intervalo PQ curto (99ms), presença de onda delta em todas as derivações e QRS alargado. A avaliação complementar subse- quente incluiu: • Ecocardiograma transtorácico: sem alterações relevantes (pre- sença de adaptações fisiológicas induzidas pelo exercício físico); • Holter 24 horas: ritmo sinusal, com frequência cardíaca média de 85 (53-137) bpm; padrão de WPW durante todo o registo; sem extras- sístoles supraventriculares e apenas uma extrassístole ventricular; sem pausas superiores a dois segundos; • Prova de esforço em tapete rolante (protocolo de Bruce) com boa tolerância ao esforço (13m10s; 15.5 METS, 94% da frequência cardíaca máxima prevista); sem resposta disrítmica ou hiperten- siva; com padrão de WPW durante toda a prova (esforço e recupera- ção); sem alterações sugestivas de isquemia miocárdica (Figura 3). Como a pré-excitação se manteve durante toda a prova de esforço e no Holter, sugerindo uma via de condução persistente, optou-se por realizar estudo eletrofisiológico para análise das propriedades elétricas da via acessória. O estudo eletrofisiológico foi realizado com colocação de catete- res, por acesso femoral direito, no seio coronário, ápex do ventrículo direito e feixe de His. A pré-excitação foi intermitente, sendo necessário administrar adenosina durante o mapeamento, detetando-se sinal Figura 2 – ECG de 12 derivações em repouso com padrão típico de WPW: PR <120ms, onda delta (setas) e QRS>120ms. Figura 3 – ECG de 12 derivações no pico de esforço, mantendo o padrão típico de WPW (onda delta – setas). de fusão atrioventricular em região posteroseptal. Apesar de ser uma via de baixo risco, optou-se por realizar ablação da via acessória, com crité- rios imediatos de sucesso. O procedi- mento decorreu sem complicações. Entre os cuidados pós-alta foi reco- mendado não efetuar exercício físico nos primeiros 15 dias após a interven- ção e retomar a atividade profissional de forma gradual. A atleta retomou a sua atividade desportiva competitiva um mês após a intervenção. Discussão O presente caso ilustra uma situação clínica com implicações na avalia- ção do atleta. Na presença de padrão de WPW num ECG em repouso de um atleta assintomático, deve-se estratificar o risco de degenerar em fibrilhação ventricular. Constituem sinais de elevado risco: • idade jovem (<30 anos) • persistência de pré-excitação no ECG em repouso e durante o exercício • intervalo RR mais curto em fibrilação auricular pré-excitada (<250ms) • diferentes morfologias em pré- -excitação (sugestivo de vias múltiplas) e • paroxismos assintomáticos de fibrilação auricular. 5 Neste sentido, a atleta realizou ecocardiograma transtorácico para excluir patologia estrutural, prova de esforço e Holter 24 horas para avaliar a persistência do padrão WPW e iden- tificar disritmias significativas. Esta investigação é fundamental, uma vez que 40 a 50% dos pacientes com WPW vítimas de morte súbita esta- vam assintomáticos antes do evento. 6 Como a atleta manteve o padrão WPW durante toda a prova de esforço e no Holter de 24 horas (padrão persistente), podendo indi- car uma via acessória com período refratário curto e potencialmente maligna, realizou-se um estudo eletrofisiológico. Durante o estudo identificou-se uma via acessória na região posteroseptal intermitente (baixo risco) ficando a dúvida entre realizar ou não a ablação por cateter no mesmo tempo operatório. (Continua 25) Revista de Medicina Desportiva informa março 2018 · 11