Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2020 | Page 23
Como é feito o combate?
São muitas as dificuldades enfrentadas
pela AMA e pelas agências
nacionais de antidopagem. Historicamente
houve sempre um desfasamento
entre o momento em
que novas substâncias dopantes
chegam ao mercado e o desenvolvimento
e validação de um teste para
as detetar. Acresce que algumas
substâncias proibidas têm janelas
de deteção muito curtas. Estes dois
fatores tornam difícil a deteção de
algumas substâncias por métodos
diretos (espectrometria de massa e
cromatografia). Estratégias como as
transfusões autólogas são mesmo
impossíveis de detetar por métodos
diretos. Como resposta a estas dificuldades
a AMA procurou a colaboração
da indústria (farmacêutica e
não só) no sentido de desenvolver
testes específicos para algumas
substâncias dopantes antes de estas
saírem para o mercado. Introduziu
também um método indireto de
identificar práticas dopantes – o
passaporte biológico.
O passaporte biológico foi implementado
em 2009. Só nos primeiros
10 anos esteve na origem de sanções
a150 atletas. Neste método são utilizadas
amostras biológicas (sangue
e urina), obtidas dentro e fora de
competição, para traçar um perfil
analítico longitudinal de cada atleta.
A identificação de desvios relativamente
ao perfil traçado fornece
Figura 2 – A transfusão de sangue
Figura 3 – passaporte biológico
https://exame.abril.com.br/brasil/
fifa-anuncia-passaporte-biologico-para-copa-de-2014/
uma indicação indireta da utilização
de substâncias/métodos proibidos
(Figura 3). Esta pode ser usada
como prova de dopagem per se, mas
também para planear controlos
inteligentes com vista à deteção
da substância/método proibido de
forma direta. No módulo hematológico
os parâmetros-chave são a Hb
e a % de reticulócitos. A AMA utiliza
um score (Abnormal Blood Profile Score)
que inclui estes e outros cinco parâmetros.
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Os autores declaram ausência de conflito
de interesses, assim como a originalidade
deste texto e a sua não publicação prévia.
Correspondência
José Pedro Marques
FPF – [email protected]
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A Agência Mundial Antidopagem
alterou um aspeto da International
Standard for Testing and Investigations,
que é a secção do Código
que define os procedimentos a
usar durante a recolha das amostras
biológicas. O valor mínimo
da gravidade específica (GE),
medida com o refractómetro, passou
de 1.005 para 1.003 nos casos
em que o atleta produza mais de
150ml de urina. Se o volume de
urina for entre 90ml (o mínimo
exigido) e 150ml mantém-se o
valor mínimo anterior de 1.005.
Esta alteração entrou em vigor
em 1/mar/2020. Esta alteração
vem permitir ganhar sensibilidade
na deteção de metabolitos que
estejam muito diluídos na urina
com baixa GE, pois laboratório
conseguirá “concentrá-la” e assim
dar uma resposta mais correta. O
conteúdo do frasco A, o analisado
em primeira instância e que até
agora era enchido com o volume
mínimo de 60ml, será cheio até
ao limite máximo permitido pelo
fabricante no caso dos 150ml,
enquanto o frasco B, a ser usado
eventualmente numa contra-análise,
poderá ser cheio até 50-60ml,
por exemplo. É uma evolução
na luta contra a dopagem, pois
será um modo de ultrapassar a
hiperidratação que alguns atletas
aparentemente faziam antes da
sessão de controlo, com o objetivo
de produzirem urinas muitíssimo
diluídas. O rim normal consegue
produzir urina com a diluição
de 40 a 80 mOsm/kg perante a
hidratação excessiva e a urina
concentrada perante a desidratação
excessiva (800 a 1400 mOsm/
kg). Existe uma relação praticamente
linear entre osmolalidade
e GE: 40mOsm são equivalentes
a 1 unidade de GE. Neste caso,
1.003 e 1.005 correspondem,
aproximada e respetivamente, a
120 e 200mOsm/kg de água. Ref.
Lillian A. Mundt, Kristy Shanahan.
Exame de Urina e de Fluidos
Corporais de Graff – 2ª ed, 2016; 2.
FIFA (comunicado interno). BR
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