Revista de Medicina Desportiva Informa Maio 2019 | Page 15
meses de terapêutica, não apresen-
tava alterações, hemoglobina 14.6g/
dl, saturação de transferrina 11 %,
ferritina 102.5 ng/ml, ferro sérico 38
ug/dl e capacidade total de fixação
do ferro 349 ug/dl.
Discussão
Trata-se de um caso de hemocroma-
tose secundária associada a admi-
nistração parentérica de ferro em
doses controladas e mutação H63D
em heterozigotia. Este genótipo
indica que o indivíduo é portador da
mutação p.H63D, mas não confirma
o diagnóstico de hemocromatose
hereditária (diagnóstico feito na
presença da mutação C282Y em
homozigotia). A frequência alélica
desta mutação difere entre popula-
ções, pode atingir até 20% e tem
uma probabilidade de 50% de ser
transmitida à descendência. Por si só
não é suficiente para causar
aumento dos níveis de ferro, apenas
quando associada a outro fator de
risco, como suplementação de ferro,
diabetes ou consumo excessivo de
bebidas alcoólicas. 3,6 Chicharro et al
encontraram uma elevada propor-
ção de mutações no gene HFE
(49,2%) em atletas de resistência. 7
Neste mesmo estudo, a prevalência
de heterozigotia do H63D foi signifi-
cativamente superior (p=0,01) nos
atletas de resistência que nos de
controlo, 41,5% para 24,6%, respeti-
vamente. Valores semelhantes foram
observados por Deugnier et al que
reportaram uma prevalência
aumentada de mutação do H63D em
ciclistas franceses quando compa-
rado com controlos saudáveis. 8 No
entanto, ainda está por provar que
estas mutações proporcionam uma
espécie de vantagem metabólica a
estes atletas. Outro dado observado
por Chicharro et al foi que 61,1% dos
atletas com elevada concentração de
ferritina tinham mutação do gene
HFE. 7 Assim, e visto que são vários
os atletas de resistência a tomar
suplementos de ferro em quantida-
des potencialmente tóxicas 10 , e este
aparenta ser um grupo com maior
prevalência de mutações do gene
HFE, podemos considerar impor-
tante uma avaliação regular das
reservas de ferro de modo a prevenir
uma sobrecarga de ferro iatrogénica.
Conclusão
Alertamos com este caso clínico
para uma vigilância regular nos
atletas suplementados com ferro e
ainda para a importância de pesqui-
sar a mutação do gene HFE quando
estamos perante um atleta com
os fatores de risco mencionados
e hiperferritinémia ou saturação
de transferrina > 45%. A associa-
ção destes fatores pode levar a
sobrecarga de ferro com toxicidade
orgânica importante, que se não for
atempadamente diagnosticada e
tratada, pode conduzir a falência de
órgão com consequências drásticas.
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