Revista de Medicina Desportiva Informa Julho 2013 | Page 29

sido investigado para combater a dor crónica de natureza inflamatória e neuropática ; estudos preliminares propõem a utilização de agonistas CB2 para prevenir a perda óssea ; e ( 3 ) o uso de inibidores da degradação dos canabinoides através da FAAH pode ser uma estratégia promissora no tratamento da epilepsia e da ansiedade .
3 . … mas são prejudiciais à saúde , não são ?
PS – Apesar dos canabinoides serem usados há mais de 4000 anos para fins recreativos e médicos , tal prática ainda é hoje envolvida em alguma controvérsia . Esta circunstância pode ser explicada porque os canabinoides possuem um largo espectro de ação sobre inúmeros sistemas orgânicos , alguns dos quais ainda não completamente esclarecidos , associado ao facto do seu uso estar limitado ao aparecimento de efeitos psicotrópicos intensos . Os canabinoides inibem a libertação de acetilcolina no hipocampo , que é a região do cérebro responsável pela formação da memória e aprendizagem . Também reduzem a libertação de monoaminas ( e . g . noradrenalina e dopamina ) em certas regiões do córtex cerebral , dos gânglios da base e do cerebelo , responsáveis pelo controlo do ciclo sono / vigília e pelas alterações da coordenação motora . Os canabinoides exógenos mimetizam as ações de endocanabinoides derivados endógenos dos ácidos gordos , como a anandamida e o 2 – araquidonilglicerol ( 2 – AG , 200x mais abundante no cérebro que a anandamida ), sobre recetores metabotrópicos , CB1 e CB2 . Os recetores CB1 são dos recetores mais abundantes no cérebro ( principalmente no córtex cerebral , hipocampo , gânglios da base , amígdala , hipotálamo e cerebelo ), embora também existam em vários tecidos periféricos , como o coração e a vasculatura . Os recetores CB2 foram sobretudo identificados nas células do sistema imunitário .
Assim , a administração de THC ou dos seus derivados , mesmo quando usados clinicamente , produzem efeitos comportamentais complexos ( e . g . sonolência , confusão , euforia e reações paranoides ) devidos à alteração de vários sistemas neuroquímicos resultantes da ativação preferencial de recetores CB1 . Estes efeitos são responsáveis pelo aumento do risco de acidentes ( de viação e , também , desportivos ). É também frequente a ocorrência de ansiedade , astenia , rubor facial e congestão ocular , palpitações e taquicardia . Em doses mais elevadas ocorre amnésia , ataxia e alucinações . Ora , esta sintomatologia é incompatível com a prática desportiva . Os canabinoides causam habituação e sintomas de abstinência através da atuação nas vias dopaminérgicas mesolímbicas do sistema de recompensa . A dependência é caraterizada por alterações do comportamento que podem afetar decisivamente o estado emocional e intelectual do atleta , além de aumentarem o risco para o consumo concomitante de álcool e outras drogas ilícitas .
Para além destes factos , existe um debate menos esclarecido na literatura sobre as propriedades dos outros componentes da Cannabis para além do THC , nomeadamente no que respeita à farmacocinética ( e . g . administração oral vs inalatória ) e ao contributo do canabinol e canabidiol para a eficácia terapêutica / efeitos adversos associados ao consumo de Cannabis . Apesar dos agentes carcinogénicos encontrados no fumo de marijuana ou de haxixe serem muito semelhantes ao fumo do tabaco ou de qualquer outra planta , os níveis de hidrocarbonetos aromáticos policíclicos são muito superiores nos primeiros , explicando a elevada incidência de cancro do pulmão e da orofaringe encontrada nos consumidores de marijuana e / ou haxixe .
4 . Prof . Sidónio Serpa , tem conhecimento como está a evoluir o consumo em geral de canabinoides em Portugal ?
SS – Nas consultas que fiz apenas encontrei dados de 2007 comparando com 2001 , já que não estavam ainda disponíveis os resultados do estudo realizado em 2012 pelo Instituto da Droga e da Toxicodependência . De acordo com esse documento , houve um aumento do consumo entre
2001 e 2007 , designadamente no que respeita à população jovem-adulta ( 15 – 34 anos ). Dos diversos estudos referidos no relatório de 2012 do IDT fica a ideia de que os canabinoides são as substâncias com maior incidência de consumo , o que é confirmado com dados de 2010 e 2011 provenientes de outros estudos , como o HBSC / OMS e o ESSAD que registam novos aumentos de consumos .
5 . Os controlos positivos com canabinoides têm vindo a aumentar . Quais são os valores em termos absolutos nos últimos três anos ?
LH – O elevado número de violações de normas antidopagem relacionadas com canabinoides que se verifica em Portugal não representa uma exceção , quando enquadrada esta situação no panorama internacional : em todos os países esta situação se verifica . Temos vindo a assistir a um aumento do número de violações de normas antidopagem por canabinoides em termos relativos , levando em consideração as substâncias detetadas em violações de normas antidopagem por casos analíticos . Em termos absolutos , verificou-se um número estável de violações por canabinoides no período 2009 a 2011 , e um aumento significativo em 2012 , conforme se pode verificar no Quadro 1 .
6 . Os canabinoides têm efeito positivo no rendimento desportivo ?
PS – Os canabinoides são diferentes de qualquer outra substância dopante usada no desporto , já que não melhoram a performance desportiva , podendo mesmo até ser contraproducentes e perigosos para integridade física dos atletas por
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