Revista de Medicina Desportiva Informa Janeiro 2020 | Page 16
Rev. Medicina Desportiva informa, 2020; 11(1):14-15. https://doi.org/10.23911/CC_frat_stress_ramos_2020_01
Fratura Stress dos Ramos
Isquiopúbicos: Caso Clínico e
Breve Revisão Bibliográfica
Dr. João Moura 1 , Dr. Luís Maia 1 , Dr. Ricardo Marta 1 , Dr. Tiago Basto 2 , Dr. João Lourenço 3
1
Interno de Formação Especifica de Ortopedia, 2 Assistente Hospitalar de Ortopedia, 3 Assistente Hospitalar
Graduado Sénior de Ortopedia, Serviço de Ortopedia do Hospital da Senhora da Oliveira EPE, Guimarães.
RESUMO / ABSTRACT
As fraturas de stress são lesões relativamente comuns, normalmente implicam paragem
prolongada em atletas profissionais e amadores. Originam-se habitualmente num meca-
nismo de sobrecarga, em que a função osteoblástica do tecido ósseo é suplantada pela sua
atividade osteoclástica, resultando em fratura que se torna progressivamente sintomática.
As fraturas de stress da região pélvica são menos frequentes entre os atletas, especial-
mente nos fundistas. Apesar do bom prognóstico, o diagnóstico e tratamento devem ser
céleres. Apresentamos o caso de uma atleta amadora em regime de treino intensivo para
prova de maratona. A queixa inicial consistia em dor sobre a região púbica direita, com
três meses de evolução e agravamento progressivo. O estudo imagiológico mostrou sinais
de fratura nos ramos ísquio-ileo-púbicos. Suspendeu corrida, com descarga durante
duas semanas, seguida de carga progressiva e reabilitação funcional. Aos quatro meses
apresentava-se assintomática e de regresso aos treinos.
Stress fractures are common and problematic injuries in athletes and non-athletes, usually resulting
from an overuse mechanism, followed by symptomatic fracture. Fractures of the pelvic region are rel-
atively rare among athletes, especially among marathoners. Despite the good prognosis, the diagnosis
and treatment must be fast to avoid aggravation. We describe a clinical case of an amateur athlete,
on intensive training for marathon test, who reports pains in the right pubic region for three months
with progressive aggravation. The radiological images showed signs of fracture of the ischio-iliopubic
branches. She suspended run, was on discharge for two weeks, followed by progressive loading and
functional rehabilitation. At four months she was asymptomatic and returned to training.
PALAVRAS-CHAVE / KEYWORDS
Fratura de stress, dor pélvica, desporto intenso
Stress fracture athletes, pelvic pain, intense sport
Introdução
As fraturas de stress, também
conhecidas como fraturas de fadiga
ou fraturas de marcha, são lesões
comuns e problemáticas em atletas
e não atletas, afectando tipicamente
fundistas, dançarinos e militares,
mas podem atingir qualquer pessoa
sujeita a movimentos repetitivos ou
treino de sobrecarga. Foram descri-
tas pela primeira vez em 1855 por
Breithaupt e não se trata de uma
patologia de causa unifactorial, mas
o resultado cumulativo de vários
fatores de risco. As fraturas resultam,
habitualmente, de um mecanismo
de overuse, com microtraumas repe-
titivos que culminam numa fratura
clinicamente sintomática. 1-4
A etiologia permanece ainda
incerta, existindo alguns fatores de
risco associados, como o sexo, idade,
raça, estado hormonal, nutrição,
14 janeiro 2020 www.revdesportiva.pt
função neuromuscular e fatores
genéticos. Há ainda outros fatores
predisponentes, como desalinha-
mento ósseo, fatores biomecânicos,
técnica de corrida, irrigação óssea
insuficiente, calçado inapropriado
e piso demasiado rígido, os quais
podem levar à descontinuidade
óssea. As fraturas de stress aparecem
comummente nos ossos de carga,
sendo a tíbia o osso mais afetado,
podendo potencialmente atingir qual-
quer osso sujeito a sobrecarga 1,3,5,6
As fraturas de stress da região
pélvica são uma patologia relati-
vamente pouco frequente entre a
maioria dos atletas, podendo ser
encontradas nos ramos isquiopúbi-
cos, local mais frequente na região
pélvica, e também no colo do fémur,
sacro ou acetábulo. 7 As fraturas dos
ramos púbicos inferiores, adjacen-
tes à sínfise púbica, são não raras
vezes diagnosticadas como osteite
púbica ou “strain” (estiramento) dos
adutores. 10 Apesar de rara, é uma
patologia que atinge predominante-
mente os atletas de corrida de longa
distância, podendo estar associadas
à anorexia e à amenorreia entre
atletas do sexo feminino, provavel-
mente associada a estados deficitá-
rios de estrogénio. 3,6,8
No que diz respeito aos meios
complementares de diagnóstico, a
Ressonância Magnética (RMN) é o
exame gold-standard para confirmar
o diagnóstico. O diagnóstico com
radiografia convencional pode ser
difícil e por vezes tardio. Os sinais
radiográficos são subtis e surgem
meses após o início da sintomato-
logia, consequentemente têm baixa
sensibilidade diagnóstica. Assim,
quando existe suspeita de fratura
de stress deve ser realizada a RMN. 9
Esta apresenta alta sensibilidade
diagnóstica, bem como sensibili-
dade (ao contrário da cintigrafia,
que apesar de alta sensibilidade,
apresenta baixa especificidade). A
tomografia computorizada também
pode ser um recurso no diagnóstico,
apesar de limitada na avaliação da
atividade da lesão. A ecografia pode
ser usada na suspeita de uma lesão
superficial, bem como no diagnós-
tico diferencial.
Após o diagnóstico, o tratamento
adequado visa o controlo da dor,
promover a recuperação e prevenir o
agravamento. 12 Assim, o tratamento
das fraturas de stress da região pél-
vica envolve abolição de atividades
que provoquem dor (correr, saltar,
rematar, etc). Os treinos alternativos,
como bicicleta com baixa resistência
e natação, podem ser uma solução
para evitar a paragem completa,
mas devem ser realizados sem dor e
de uma forma confortável. 11 O tra-
tamento conservador com cessação
das atividades “provocatórias” tem
excelentes resultados. 9
Os doentes que apresentam dor em
repouso devem ser tratados com des-
carga do membro e uso de canadia-
nas, bem como terapêutica analgésica
e anti-inflamatória (em menor quan-
tidade, pois pode atrasar o processo
de cicatrização óssea). 13 Em casos
raros, se não houver uma consolida-
ção após tratamento conservador, a
cirurgia pode estar indicada. 9
O prognóstico após uma fratura
de stress da região púbica é bom.