RELATÓRIO FINAL DA SUBCOMISSÃO DA VERDADE NA DEMOCRACIA Relatório Final Desaparecimento Forçado na Democ | Page 10
em minhas pesquisas focalizando a experiência de familiares de vítimas de violência,
particularmente de casos de desaparecimento forçado, pude observar uma queixa
constante dos familiares em relação ao tratamento de seus casos por parte da polícia. A
reputação da vítima, dos familiares e de seus locais de moradia era suficiente para a
construção por parte da polícia da (des)importância dessas ocorrências e sua consequente
não investigação. Quando as denúncias apontam a participação de policiais ou ex-policiais,
seja através da violência policial ou da violência das milícias, em disputa ou em colaboração
com o tráfico de drogas, o corporativismo policial torna-se outra barreira à investigação dos
casos. 16 (grifos nossos)
Quando tratamos do racismo estrutural e do racismo institucional estamos aderindo a perspectiva
da importância de voltar o olhar ao racismo não do ponto de vista individual e sim das estruturas
de poder e do modo de conformação das instituições que permitem que ele venha se mantendo
ano após ano.
Assim, nos interessa nesse relatório um olhar estrutural, institucional e voltado ao Estado.
Pretendemos demonstrar como a ação e omissão do Estado por meio de suas instituições permite
a existência do desaparecimento forçado, impede a responsabilização dos culpados, penaliza os
familiares (vitimas indiretas) com uma conduta que não permite a localização do paradeiro da vítima
direta e os coloca em risco.
Entendemos o desaparecimento forçado como um crime cometido pelo Estado que agiu por meio
de algum agente (por ação, omissão ou conluio) e é reiterado em cada conduta omissiva, em cada
falha institucional que não permite a elucidação do fato. Portanto, não iremos nos focar em quem
são os acusados individualmente pela prática e sim nas condutas do Estado por meio de suas
instituições. Assim, evitamos expor mães e familiares ainda mais ao risco e nos voltamos ao debate
sobre o quão grave é que o Estado do Rio de Janeiro possua práticas seletivas, sistêmicas e
sistemáticas que produzam desaparecidos políticos durante o regime democrático.
Esse relatório irá apresentar primeiramente um mapeamento dos marcos legais existentes sobre o
tema e a sua necessidade de aprimoramento para a garantia da memória, da verdade e da justiça
sobre os casos de desaparecimento forçado.
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ARAUJO, Fábio Alves. “Não tem corpo, não tem crime”: notas socioantropológicas sobre o ato de fazer desaparecer
corpos. Horiz. antropol. [online]. 2016, vol.22, n.46, pp.37-64. ISSN 0104-7183. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-
71832016000200002.
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