Projeto Cápsula Aqueles que Abandonam Omelas | Ursula K. Le Guin | Page 17

Muitas vezes, quando a veem e enfrentam esse terrível paradoxo, os jovens voltam para casa aos prantos ou em uma raiva sem lágrimas. Podem re- moer aquilo por semanas ou anos. Mas, com o pas- sar do tempo, começam a perceber que mesmo se a criança pudesse ser libertada, não se beneficiaria muito de sua liberdade: um pequeno e vago prazer com o calor e a comida, certamente, mas pouco mais do que isso. Estava muito humilhada e imbecilizada para reconhecer qualquer alegria verdadeira. Pas- sou tempo demais amedrontada para se libertar do medo. Seus hábitos são rudes demais para reagir a um tratamento humano. De fato, depois de tanto tempo, provavelmente se tornaria miserável sem as paredes ao seu redor para protegê-la, a escuridão para os olhos e o próprio excremento onde se sen- tar. As lágrimas diante da amarga injustiça secavam quando começavam a perceber a terrível justiça da realidade e a aceitá-la. Ainda assim, são suas lágri- mas e raiva, a tentativa de generosidade e de acei- tação de sua impotência que constituem, talvez, o verdadeiro manancial de esplendor de suas vidas. A felicidade delas não é banal ou irresponsável. Elas sabem que, como a criança, não são livres. Conhe- cem a compaixão. É a existência da criança e o fato 12