O voo da Gaivota 1 | Page 36

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Nas folhas de um quadro desenha uma casa e mostra-nos o gesto que lhe corresponde . Em seguida desenha uma pessoa adulta , dizendo :
" É o teu pai , tu és filha do teu pai ; é a tua mãe , tu és filha da tua mãe ."
Mostra também alguém à procura de qualquer coisa . Primeiro através de mímica , seguidamente por gestos , pergunta-me :
" Onde está a tua mãe ?" Eu respondo por mímica . " A mãe não está ." Ele corrige-me .
" A mãe está onde ? A mãe está em casa ." Faz o gesto de mãe e de casa .
Uma frase completa . " A mãe está em casa ." Aos sete anos exprimo finalmente , com as minhas duas mãos , a identificação da minha mãe e do local onde se encontra !
Encarando Alfredo de olhos nos olhos , repito com as minhas duas mãos , radiante : " A mãe está em casa ."
Nos primeiros dias aprendo palavras do quotidiano , seguidamente os nomes das pessoas . Ele é Alfredo , eu sou Emmanuelle . Um gesto para ele , outro para mim .
Emmanuelle : " O sol que parte do coração ." Emmanuelle para os que ouvem , o sol que parte do coração para os surdos . Pela primeira vez ensinam-me que se pode dar um nome às pessoas . E também isso é formidável . Eu não sabia quem na minha família tinha nome , a não ser o meu pai e a minha mãe .
Encontrava pessoas , amigos dos meus pais , membros da família , mas para mim nenhum tinha nome , qualquer definição . Fiquei tão surpreendida ao saber que ele se chamava Alfredo e o outro Bill ... E eu , sobretudo eu , Emmanuelle . Percebi enfim que tinha identidade . EU : Emmanuelle .
Até então eu falava de mim como de uma outra pessoa , uma pessoa que não era " eu ". Diziam sempre : " A Emmanuelle é surda ." Era assim : " Ela não te ouve , ela não te ouve ." Não havia " eu ". Eu era " ela ".