O voo da Gaivota 1 | Page 13

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3. O silêncio das Bonecas
A aprendizagem da comunicação começou pelo método de Borel-Maisonny, com uma ortofonista, uma mulher extraordinária, que soube ouvir os queixumes da minha mãe, suportar o seu desespero e as suas lágrimas. Brincava comigo às bonecas, com água, aos jantarinhos. Mostrou à minha mãe que era possível estabelecer uma relação comigo, fazer-me rir, para que eu continuasse a viver como " antes ", de ela se ter apercebido da minha surdez.
Aprendi a articular os AA, os BB, os CC, mostravam-me as letras através de movimentos dos lábios e de gestos das mãos.
A minha mãe assistia às sessões. Era um estabelecer de contato mãe / filha. Foi por se identificar com aquela mulher que a minha mãe reaprendeu a falar comigo.
Mas a nossa maneira de comunicar era instintiva, animal, poderia chamar-lhe " umbilical ". Tratava-se de coisas simples, como comer, beber, dormir.
A minha mãe não me impedia de fazer gestos, embora lhe tivessem recomendado. Tínhamos sinais só nossos, completamente inventados. A mãe disse:
- " Fazias-me chorar a rir tentando comunicar comigo por todos os meios! Eu virava a tua cara de frente para a minha para que tentasses ler palavras simples e tu mimavas ao mesmo tempo, era lindo e irresistível."
Quantas vezes fez ela esse gesto de virar o meu rosto de frente para o seu, aquele gesto do frente a frente mãe-filha, fascinante e terrível, que nos serviu de linguagem?
Desde essa altura, não houve mais lugar para o outro, para o meu pai. Quando ele voltava do trabalho, as coisas tornavam-se mais difíceis, eu passava pouco tempo com ele e não tínhamos o código " umbilical ". Eu articulava algumas palavras, mas ele quase nunca as entendia. Custava-lhe ver a minha mãe comunicar comigo numa linguagem de grande intimidade, que lhe escapava a ele. Sentia-se excluído. E ficava realmente excluído por não se tratar de um diálogo que pudéssemos partilhar entre os três, nem com qualquer outra pessoa. E ele queria comunicar diretamente comigo. Aquela exclusão revoltava-o.
Quando voltava para casa ao fim da tarde, não conseguíamos partilhar nada. Era frequente eu ir puxar pelo braço da minha mãe para ela interpretar o que ele dizia. E eu teria gostado tanto de " falar "