O voo da Gaivota 1 | Page 10

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"- Foi a primeira pessoa que nos alertou!"
Esta cena ficou para sempre gravada na minha memória, como uma imagem fixa ", disse a minha mãe.
Os meus pais preferiram ignorar. De tal maneira que, por exemplo, só muito mais tarde soube que os meus avós paternos tinham casado na capela do Instituto Nacional dos Jovens Surdos de Bordéus, cuja direção estava a cargo do sogro da minha avó! Tinham-se " esquecido "!
Para esconder a sua inquietação, talvez para não terem que encarar a realidade. Resumindo, estavam radiantes por não terem uma“ chorona " a acordá-los de manhã cedo. E assim habituaram-se a brincar chamando-me gaivota com medo de admitirem que eu era diferente.
Grita-se o que se quer calar, costuma dizer-se. Quanto a mim, devia gritar para tentar distinguir a diferença entre o meu grito e o silêncio.
Para compensar a ausência de todas aquelas palavras que eu via mexer nos lábios da minha mãe e do meu pai, cujo sentido ignorava. stia, talvez eu gritasse também em seu nome, quem sabe? A mãe disse: " O pediatra achou que eu era doida.”
Ele também não acreditava. Havia sempre aquela história das vibrações que tu sentias. Mas quando se batia as palmas ao teu lado ou atrás de ti, não voltavas a cabeça na direção do ruído. Chamávamos por ti e tu não respondias. E eu dava-me conta de todas essas coisas bizarras. Parecias surpreendida a ponto de teres um sobressalto quando eu chegava ao pé de ti, como se eu surgisse inesperadamente. De início, pensei em problemas psicológicos, sobretudo porque o pediatra que te via todos os dias, todos os meses não queria acreditar no que eu lhe dizia. " Marquei consulta mais uma vez para lhe dar parte dos meus receios. Disse-me categoricamente:
"- Minha senhora, aconselho-a a que se vá tratar!"
E ao dizer isto bateu propositadamente com a porta, e como por acaso tu viraste a cabeça por teres sentido a vibração ou simplesmente porque o seu comportamento te parecia estranho, disse: