O joo do anjo Carlos Ruíz Zafón - O Jogo do Anjo | Page 25
PDL – P ROJETO D EMOCRATIZAÇÃO
DA
L EITURA
esmaltado, da qual pendia um lustre, também de cristal, sob o qual uma mesa de mogno
sustentava um enorme gramofone que sussurrava uma ária de ópera.
— Posso lhe oferecer algo para beber, cavalheiro?
— Agradeceria um copo d'água, se fosse possível.
A dama do cabelo branco sorriu sem pestanejar, imperturbável em seu porte amável e
sereno.
— Talvez lhe pareça melhor uma taça de champanhe ou um licor. Ou quem sabe um
xerez.
Meu paladar não distinguia nem as diferenças entre as várias safras da água de
torneira, de modo que dei de ombros.
— Pode escolher.
A dama concordou sem perder o sorriso e apontou para uma das suntuosas poltronas
espalhadas pela sala.
— Se o cavalheiro quiser sentar, Chloé estará aqui em segundos.
Pensei que fosse engasgar.
— Chloé?
Alheia à minha perplexidade, a dama do cabelo branco desapareceu por uma porta
atrás de uma cortina de contas negras, deixando-me a sós com meus nervos e meus
inconfessáveis desejos. Perambulei pela sala para dissipar a tremedeira que tomava conta
de mim. A exceção da música suave e da batida de meu coração nas têmporas, aquele
lugar era uma tumba. Seis corredores partiam da sala, franqueados por aberturas cobertas
por cortinados azuis, que conduziam a seis portas brancas de folha dupla fechadas.
Deslizei para uma das poltronas, concebida para balançar o traseiro de príncipes regentes
e generalíssimos com uma certa queda por golpes de Estado. Logo a dama de branco
regressou com uma taça de champanhe numa bandeja de prata. Aceitei e ela desapareceu
de novo pela mesma porta. Bebi a taça de um só gole e afrouxei o colarinho da camisa.
Começava a suspeitar que talvez tudo aquilo não passasse de peça montada por Vidal
para se divertir às minhas custas. Naquele momento vislumbrei uma figura que avançava
em minha direção por um dos corredores. Parecia uma menina, e era. Caminhava com a
cabeça baixa, sem que eu pudesse ver seus olhos. Levantei.
A menina inclinou-se numa reverência e fez sinal para que a seguisse. Só então
percebi que uma de suas mãos era postiça, como a de um manequim. Levou-me até o final