O imprevisível 2018 PD49 | Page 155

Angústia. Um ano depois, dá à estampa – As Etapas no Caminho da Vida e, em 1846, o Post-Scriptum a Migalhas Filosóficas. Os paradoxos da existência religiosa, para este filósofo, assu- mem o caráter socrático do autoconhecimento e a reflexão acerca do indivíduo diante da verdade cristã. Kierkegaard elabora seu pensamento, tendo em vista o exame concreto do homem religioso historicamente situado, o que o eleva à condição de fundador do existencialismo. Desde a década de 1850, Kierkegaard foi tomado por um surto de reformador da moral teológica, passando a atacar a prática religiosa vigente na Dinamarca, onde o poder estatal se sobrepu- nha ao poder religioso. Mas Soren, infelizmente, veio a falecer em outubro de 1855. As inquietações e angústias, que o acompanharam, estão expressas em seus textos, incluindo a relação dolorosa que manteve com o Cristianismo – herança de um pai extremamente religioso, que cultuava os rígidos princípios do Protestantismo, o qual, na Dinamarca de meados do século dezenove, foi transfor- mado em fundamentalismo religioso controlado pelo Estado. A posição de Kierkegaard leva alguns estudiosos a levantar dúvidas a respeito do caráter filosófico de seu pensamento. Para estes, tratar-se-ia muito mais de um pensador religioso do que de um filósofo. Nele não encontramos as motivações tradicionais que servi- ram de objeto para a Filosofia. Isso fica claro quando ele reage às filosofias de sua época – em especial à de Hegel. Não se trata de questionar as incorreções ou as inconsistências do sistema hege- liano. Trata-se muito mais de rebelar-se contra a própria ideia de sistema e aquilo que essa ideia representa. Para este pensador, o homem que se reconhece finito enquanto parte da realização de uma totalidade infinita, se compraz na finitude, porque a vê como uma etapa de algo cujo sentido é infi- nito. Mas o homem que se coloca frente ao seu destino e à sua finitude, desnudado do aparato lógico, não se vê diante de um sistema de ideias mas diante de fatos, mais precisamente de um fato fundamental que nenhuma lógica pode explicar: a Fé. Ela não é o sucedâneo daquilo que não podemos compreender racio- nalmente; tampouco é um estádio provisório do que existe enquanto não se completam e fortalecem as luzes da razão. Soren Kierkegaard 153