C APÍTULO 2 :: 15
“O intercâmbio cultural entre povos andinos e amazônicos vinha de
milênios de convivência. Habitando áreas geográficas muito próximas,
compartilhavam costumes, línguas, canções, histórias e sabedorias. A floresta
tropical comportava um número expressivo de habitantes e a dinâmica social dos
grupos lá estabelecidos era bem mais complexa do que se pensava. O Império
Inca, por sua vez, precisou ter uma postura flexível e diplomática para tentar
conquistar os povos indígenas que viviam na Amazônia ocidental.
Extensas e antigas redes de comércio de longa distância ligavam os
Andes e Amazônia, permitindo um fluxo constante de produtos procedentes
das duas áreas. Enquanto penas, algodão, tecidos e plantas subiram a
cordilheira, metais (machados de cobre) e tecidos de lã desciam para a
floresta.” (Cristiana Bertazoni. A cordilheira e a floresta. Revista de História
da Biblioteca Nacional. Ano 8, nº 91, abril 2013, p. 24.)
Assim, a expansão dos incas atingiu diretamente a vida desses povos
indígenas da Amazônia. Alguns grupos migraram para fugir do domínio dos
incas e outros passaram a estabelecer contatos para a realização de trocas e
alianças políticas e comerciais. Ou seja: nesse contexto, houve mudanças na
história dessas sociedades indígenas da Amazônia.
Pensando sobre os povos indígenas da América
Após tudo o que discutimos sobre os sociedades nativas americans nos
séculos XIV e XV, gostaríamos agora de colocar algumas questões para
sua reflexão, baseadas nas ideias do professor Jurandir Bessa Freire, da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). A primeira delas é: será
que, usando o termo “índio”, conseguimos transmitir a enorme diversidade
que caracteriza os povos que habitavam nosso continente antes da chegada
dos europeus, com suas formas particulares de viver, produzir, acreditar, se
comunicar? Certamente que não. Um estudo sobre as línguas faladas na
Amazônia no século XVI identificou mais de 700 línguas diferentes!
Ainda hoje, no Brasil, há mais de 200 etnias indígenas, falando 188
línguas, com artes, religiões e conhecimentos específicos. Como resumir,
então, toda essa história em uma palavra e uma imagem: o “índio”,
geralmente associado a uma pessoa nua ou usando tanga, no meio da
floresta, de arco e flecha?
Ao mesmo tempo, é muito comum que as culturas indígenas sejam vistas
como atrasadas. Mas, se você reler com atenção as informações contidas
nesse capítulo, a que conclusões chegará? Como considerar atrasados povos
que desenvolveram um profundo conhecimento sobre a natureza – solos,
plantas, animais, colheitas, astronomia – que lhes permitiu garantir sua
sobrevivência material e estabelecer intercâmbios econômicos?
Com certeza, o caminho trilhado pelos sábios nativos era diferente
do que chamamos hoje de científico, mas, nem por isso, menos capaz
de produzir conhecimentos importantes. Quantas vezes conhecimentos
tradicionais, transmitidos por pessoas mais velhas, nos ajudam em nossa
vida cotidiana? Serão os “cientistas” os únicos a possuir o conhecimento
verdadeiro do mundo?
Nesse processo histórico de organizar-se, garantir sua sobrevivência,
dominar a natureza, relacionar-se com sociedades vizinhas, os povos
indígenas transformaram-se continuamente. Às vezes, migraram para
outras regiões; em outros momentos, alteraram suas formas de produção
econômica, suas línguas e crenças em contato com outros povos, americanos
ou não. Assim como ocorreu com europeus, africanos, asiáticos ao longo dos
séculos. As sociedades nativas não estavam paradas no tempo, congeladas!
Muito pelo contrário, modificaram-se continuamente e estabeleceram
novas formas de vida. Conhecer essas mudanças é extremamente importante
para entendermos melhor a história da formação da sociedade brasileira,
profundamente marcada pela presença das culturas nativas. E para
desenvolver uma relação de maior respei