Madame Eva Nº2 | Page 7

Nada disso é digno de nota , confesso , e certamente não levaria um cronista mediano a sentar-se de frente a sua máquina de escrever para redigir tão extensa ponderação ...
Acontece que ainda hoje fui provocado por um punhado de confete no chão à porta da redação de onde agora escrevo . Entre uma pedra portuguesa e outra , que ornam as calçadas da Rua da Flor , com seu desenho em preto e branco , avistei um confete azul , outro verde , mais para lá um vermelho e também outro amarelo ! Olhei para o alto e lá , nos emaranhados fios negros da Light , descansava a coloração das serpentinas de blocos passados !
Aos poucos , sem pedir licença , o Carnaval todo foi entrando na minha cabeça , com música , fantasia , cachaça e o diabo a quatro ! Meu chefe que não me ouça , mas juro , leitor , juro que eu estava a um compasso de sair em procura de uma folia remanescente do já findado reinado de Momo . Por sorte , meu emprego foi-me salvo pelo Barcelos , que , avistando-me paralisado diante do prédio , me cumprimentou com um tapa nas costas ,
-Vamos entrar ? O ano começa hoje , Xavier , começa hoje , disse entusiasmado .
De fato , começa , e é esse o alvo desta crônica .
É que aqui , aqui , neste fim de mundo , nesta nossa querida cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro , aqui o carioca ainda recita Homero , ainda vive pela poesia e ainda marca o Tempo como o intervalo entre acontecimentos significativos . Aqui , o ano não tem trezentos e sessenta e tal dias . Aqui , cada ano tem seu tempo . Aqui , o carioca professa que o Tempo não se mede pelos ponteiros do relógio , nem muito menos pela repetição monótona dos acontecimentos diários , mas pela cor do confete no chão e da serpentina nos postes . Quanto mais desbotados , mais se alegra meu concidadão , pois sabe , não que o Carnaval acabou , mas que o Tempo entre um Carnaval e outro já é menor do que era .
Conrado Iancarelli © 2 017

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