Madame Eva Nº2 | Seite 11

Alimento-me dos frutos, sobretudo daqueles que me satisfazem a vitalidade por dias seguidos. Mantenho a dieta carnívora, mas alimento-me dos peixes do mar. É pura jacobice; todavia, soa-me melhor comer dos peixes, com os quais já construí relação antiga. Chove pouco na ilha e o sol que me chega é mais fraco, por isso, talvez, o clima é sempre ameno, e os frutos assegurados, entra dia, sai dia. Há um rio violento que corta a ilha, e que de tempos em tempos forma com as rochas poços ou espécies de piscinas naturais no percurso – é o lugar dos meus banhos de relaxamento. Não encontrei ainda o ponto de nascimento do rio; ele, sei apenas, deságua no mar.
Esta será, certamente, a primeira de muitas garrafas, pois há ainda muito do que falar. E, sendo esta a carta de número um, preferi falar de outras coisas. Encontrei um paraíso e não desejo compartilhá-lo. Porque a perfeição de abrigos como este tem sua procura iniciada no cérebro, numa busca por fuga, numa crença em paraísos possíveis – mapas certamente não compreenderiam nem revelariam sua localização.
Ocorre-me, contudo, a questão da solidão. Há meses que não me vem uma risada. Chegou-me a ideia, portanto, de que o riso é essencialmente coletivo. Imagino que comediantes, tanto os de palco quanto os de bar, dificilmente criam piadas e riem-se, a ponto de gargalhar delas mesmas. Isso porque não mencionamos a risada de ocasião, aquela produzida apenas pelo inusitado, pelo improviso feito até pelo ser mais desengraçado existente.
Que não reste dúvida: é a solidão – está aí o interesse em produzir garrafas e ornar estes envelopes. Você que recebe em mãos estas palavras entenda que, embora eu esconda este lugar dos mapas, trato este mundo como uma casa de família. Se desejo privacidade, fecho a porta do quarto; no entanto, no caso contrário, escrevo da ilha e comunico-me. Por horas questionando-me acerca do egoísmo, cheguei à conclusão que assim prefiro pois há na gente uma tendência à servidão: diriam que é necessário hierarquizar para que funcione; que é preciso dividir para que se construa; que é necessário viciar-se no poder para governar; que é preciso consentir o sacrifício para que se retribua. E foi enfadado dessa historíola que eu me joguei no oceano, para aqui chegar.
Porque peixe é peixe, boi é boi, e peixe--boi é outra coisa.
Obrigado pela risada amiga,
Miguel Azumbarroso, da ilha”

CAFÉS ESPECIAIS SANDUÍCHES ENCONTROS

Rua Fernandes Guimarães, 91- BOTAFOGO- RIO DE JANEIRO

9