o indicador tirar medidas relâmpagos . Num simples abrir e fechar dos dedos , Eládio registrava a distância entre um e outro extremo do losango de Michaelis em qualquer dorso feminino . No bonde apertado , a moça em pé à sua frente mal sentia as medições discretas do seu “ losangoscópio ”. Apresentado a qualquer mulher que fosse , já era de praxe : os dois beijinhos e a mão direita por trás fazendo os movimentos que tiravam as proporções . Quando os números registrados fugiam dos sete ou seis centímetros e meio , Eládio espantava-se . Fascinava-se ! Se fugissem para mais , era motivo de cortejo incessante . Flores , bilhetes , chocolates , poemas e desenhos . Uma aventura à parte se desenvolvia para se aproximar da moça com o losango fora da média .
Com as informações que colhia e os estudos que aprofundava , consumido pelos infinitos desdobramentos que percebia conter o quadrilátero de Michaelis , Eládio começou a elaborar sua magnum opus , que por fim publica em 1904 . Os detalhes que levaram à impressão dos originais enviados por correio à sede da editora Chardron , no Porto , são ambíguos . O fato inegável é que o livro foi editado e circulou entre mãos europeias .
“ Os de Michaelis : tratado geométrico para a reformulação da proporção áurea ” é uma obra séria , imersa na tradição positivista , com extensa bibliografia , em que se tenta comprovar a precedência da forma losangular no mundo . O público que tomou gosto pela obra , no entanto , não foi a comunidade científica , como esperava seu autor , mas a intelligentsia vanguardistas do início do século XX .
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A rigidez arcaica das teorias totalizantes em um ambiente de proliferação de ideias relativistas fez do livro de Eládio uma joia inspiradora aos olhos dos poetas e pintores que rompiam com os cânones estéticos do século anterior . Naquela ideia de que a ciência apenas explica o que os artistas já sabem , o losango de Eládio ganhou força na representação visual . Talvez a mais significativa materialização da influência do brasileiro nas obras modernistas veio à tona em 1956 , quando no espólio de Marie Laurecin , ex-amante do poeta Apollinaire , foi encontrado uma edição de “ Os de Michaelis ”, com a dedicatória “ Guillaume , voila nos demoiselles ! P .” e datado : “ Paris , 7 / 1906 .”, na inconfundível caligrafia do pintor espanhol , Pablo Picasso , com seus “ gs ” alongados e seus “ ps ” quase fálicos . A referência às demoiselles e o ano da dedicatória sugerem que o quadro “ Les Demoiselles d ’ Avignon ”, considerado por muitos a obra príncipe do cubismo , tenha sofrido inspiração do livro presenteado , bem como as gritantes figuras losangulares em que se encontram retratadas aquelas moças de Avinhão .
Com a morte de Marie Laurecin , o livro de Eládio , por estar em português , foi parar na Embaixada do Brasil em Paris , provavelmente por articulação do então Segundo Secretário Vinícius de Moraes , que tinha bom trânsito na comunidade artística da capital francesa . Cientes do valor que aquela dedicatória tinha para a história da arte , os diplomatas em Paris encaminharam o livro para a sede do Ministério da Cultura , ainda no Rio de Janeiro .
O resto da história quem conta são as pilastras da fachada do Palácio da Alvorada , erguidas em formas de deltoides de linhas curvas , fiéis à leitura de Eládio da forma derivada do Losango de Michaelis . São as mulatas de di Cavalcanti , com frequência retratadas em posição de losango . É o losango negativo presente entre as bandeiras de Volpi e a ausência proposital de qualquer losango ou deltoide nas obras abstratas de Bandeira . Embora já presente entre os modernistas pioneiros – como Mário de Andrade , que não por acaso escolheu para capa de sua