Levante: A vida pós-cárcere de mulheres no Paraná Levante_Livro | Page 46
o sofrimento, o seu e o dos outros. Passou a olhar de outra forma
para o que antes lhe cortava o coração — de crianças em situação
de rua a pessoas com deficiências severas. Passou também a acatar
o caráter inexorável dos acontecimentos da vida, que não volta. Isso
não impede que as lágrimas lhe venham aos olhos quando pensa nos
anos em que vivia na Casa, com tia Damiana e as colegas das quais
gostava. Até hoje sonha com o lar. Vislumbra a outra vida que teria
se vivesse aquela época com a cabeça que tem hoje.
— Hoje eu estaria formada, com a minha casa. Mas é aquela
coisa, você não pode cobrar o que as pessoas não têm para te oferecer.
Empurrando com a barriga
Ela deixou a Penitenciária Feminina do Paraná pela segunda
vez em meados de 2017, em um dos mutirões carcerários realizados
de tempos em tempos para desafogar o sistema prisional. No
mutirão, conheceu Ananda Chalegre, ex-agente penitenciária que a
informou que existia um lugar onde egressos e egressas poderiam
buscar orientação e auxílio na retomada de suas vidas. Tratava-se do
Escritório Social, inaugurado em junho daquele ano e coordenado
até hoje por Ananda. No local, que atende pessoas egressas e as que
ainda estão em monitoramento eletrônico, é realizado um Plano Individual
de Atendimento, em que são identificadas suas principais
necessidades, imediatas ou a longo prazo.
Entre as possibilidades de encaminhamentos estão a regularização
ou emissão de novos documentos de identificação, acompanhamento
psicológico, encaminhamento para tratamentos de saúde
em geral e apoio na hora de se recolocar no mercado de trabalho. A
intenção é concentrar em um só lugar atendimentos e serviços vistos
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