Levante: A vida pós-cárcere de mulheres no Paraná Levante_Livro | Page 45
afeto de um homem que não estava nem aí para ela, aconselhou a
madrinha.
Magoada, nunca mais tentou achá-lo. Mas os dezesseis anos
em que os dois ficaram sem se falar cumpriram sua função de curar
as feridas, e, ao sair da cadeia pela segunda vez, quando a maioria de
seus conhecidos se encontrava atrás das grades de alguma unidade
prisional, voltou a pensar na figura afetuosa e caridosa da infância.
Seu irmão Evandro lhe passou o contato de Silvinha, que agora era
enfermeira em um hospital. Por intermediação dela, encontrou o
padrinho, hoje com 73 anos, morando no litoral com Clair. Desde
então, nunca mais se largaram.
— Ele é o homem que eu mais amo no mundo.
O que foi feito está feito, e o tempo não volta atrás, mas para
Renata e seu Agenor, cuja mente às vezes passeia de mãos dadas com
os fantasmas do passado, tudo poderia ter sido diferente.
— “Se você tivesse encontrado a gente naquela época você
teria vindo morar aqui, nada disso teria acontecido”, ele fala sempre
pra mim.
O que ela mesma pensa não é tão diferente. Se tivesse tomado
outra atitude, escutado tal conselho, buscado ajuda em tal lugar, as
coisas poderiam, de fato, ter sido diferentes. Hoje, tenta não pensar
tanto nisso. Quando na PFP, ganhou um exemplar de “O Evangelho
Segundo o Espiritismo” de uma das agentes penitenciárias, com
quem tinha esporádicas conversas sobre religião. Renata, que já tinha
sido evangélica, batizada no catolicismo e umbandista, encontrou
conforto para o coração e a mente na doutrina espírita.
— Me ajudou a entender muitas coisas, sabe?
O espiritismo ajudou-a, na verdade, a aceitar com mais facilidade
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