Levante: A vida pós-cárcere de mulheres no Paraná Levante_Livro | Page 42

Não diz isso só por falar. A história da amiga Susana não lhe sai nunca da cabeça. Veio para a penitenciária grávida de gêmeos, havia há pouco recebido o diagnóstico de infecção pelo vírus HIV. Os bebês morreram ainda no ventre da mãe e, depois do aborto espontâneo, Susana não teve mais forças para continuar no mundo. Emagreceu a olhos vistos, não se movia ou se alimentava, até que nunca mais levantou do colchão ou abriu os olhos. No diagnóstico de Renata, morreu de depressão. Se a entidade demoníaca em questão, os dez minutos de loucura, pode ser pré-requisito de sobrevivência na vida dentro de uma unidade prisional, no exterior só faz atrapalhar. Ela deixa claro: é preciso aprender a focar nas coisas e controlar você mesma o que tenta te dominar. Hoje, decidiu novamente buscar ajuda especializada. Pretende recomeçar a ver um psiquiatra. — Eu vejo esse meu monstro querendo sair toda hora e eu lutando contra ele, mas hoje eu não posso mais sozinha. *** Apesar da resposta óbvia, pergunto se ela acredita que um rótulo de ex-detenta a acompanha vida afora. Em sua avaliação, mais forte é o impacto emocional, que deixa as egressas inseguras em relação a si mesmas, suas capacidades e o futuro. No início, disse ter a impressão que onde quer que fosse, em sua testa estava escrito para quem quisesse olhar, “ex-presidiária”. Quando deixou a PFP pela primeira vez usava uma tornozeleira eletrônica, terminava de cumprir a pena da primeira condenação no semiaberto. Depois de algumas negativas em entrevista de emprego, optou por escondê-la. Dependendo da roupa, não é tão fácil. Puxava-a para cima o máximo que pudesse e usava duas calças, para disfarçar bem a protuberância gerada pelo dispositivo. 42 | LEVANTE