Levante: A vida pós-cárcere de mulheres no Paraná Levante_Livro | Page 29
rins. Estaria um passo mais perto dos objetivos futuros. Com muito
custo, passou dois meses sem entrar em confusão dentro do abrigo,
requisito imposto pela educadora para que considerasse colocar seu
nome na lista. Das seis inscritas, ela e mais uma entraram, por fim,
para a escola. Satisfeita consigo mesma, viu uma nova etapa de sua
vida começar. Sentia-se valorizada, agia de forma mais disciplinada.
Começou a mandar dinheiro para a casa da mãe e tirava notas cada
vez melhores.
— Fui vendo que era bom ter responsabilidade.
Conquistou a confiança de superiores e das educadoras da
casa. Podia ficar com seu celular e cigarros, não precisava guardá-los
na gaveta com os pertences das outras. Além disso, sua entrada e
saída eram facilitadas. Quem já encontrou Renata, entende. É difícil
não criar uma conexão, torcer por ela, desejar-lhe o melhor e, por
que não, facilitar sua vida no que for possível.
Seu pai faleceu em um acidente quando ela tinha 16 anos. A
bicicleta em que estava atingiu em cheio um caminhão. Se foi realmente
um acidente, ela tem suas dúvidas. Às vezes, acha que o pai
decidiu que não queria mais viver. No dia seguinte ao enterro, todas
as meninas deviam voltar das férias para o abrigo. Enlutada, ligou
para a Casa para explicar que gostaria de adiar um pouco o retorno.
Tia Valéria, a educadora do outro lado da linha, não poderia se importar
menos: o pai morto não era o seu, e, já que estava enterrado,
não havia mais nada a se fazer. Se Renata não voltasse, chamaria a
polícia para buscá-la.
— “Vou te rasgar inteirinha”, eu disse pra ela.
No fim, ninguém rasgou ninguém, mas a jovem decidiu que
não apareceria mais por ali. Da primeira vez que me contou essa
história, disse que fugiu sem olhar para trás. Em outra ocasião, o
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