Jornal do Clube de Engenharia 615 | Page 8

soberania

Caminhos para retomar o Brasil Amanhã : política externa , soberania e desenvolvimento

Para o diplomata Adhemar Bahadian , depende de um movimento cidadão , e só dele , mudar o destino brasileiro e resgatar as boas experiências do passado recente para frear a desestruturação das políticas públicas .
O Estado brasileiro regrediu suas políticas públicas a olhos vistos nos últimos anos . A Constituição de 1988 , a “ Constituição Cidadã ”, foi desrespeitada em meio a uma crise política , econômica , social e , em 2020 , também de saúde . A pandemia de Covid-19 escancarou nossas mais pungentes desigualdades , e pensar o Brasil de amanhã é , necessariamente , enfrentar a necessidade de fortalecer o Estado brasileiro democrático . Esta é a crítica proposta pelo diplomata e ex-embaixador Adhemar Bahadian , que é incisivo ao defender que precisamos olhar para as experiências bem sucedidas do passado recente para combater a atual onda neoliberal , privatista e submissa a interesses de nações estrangeiras .
“ Da maneira que está a situação política e econômica brasileira atual , o nosso amanhã é o ontem : estamos regredindo a situações políticas e situações econômicas que nós já tínhamos vencido ”, critica Bahadian , que integrou os quadros do Itamaraty por mais de 40 anos e foi representante do Brasil junto à Organização Mundial do Comércio ( OMC ).
“ A nossa política externa regrediu . Nós deixamos de ter uma política voltada ao que é mais importante e centrada nos dispositivos constitucionais brasileiros , na Constituição de 88 . Passamos a fazer uma política externa sem pé nem cabeça , absolutamente retrógrada , e que em menos de dois anos já nos colocou numa situação de um péssimo interlocutor internacional ”, afirmou ele , salientando o enfraquecimento das boas relações com aliados tradicionais do país , como a China e o Mercosul , e o alinhamento automático com os EUA — ainda que nenhuma contrapartida sólida tenha sido alcançada .
“ Nós estávamos numa linha ascendente , o que pode ser comprovado pela história recente do Brasil . Entre 2005 e 2010 , havia uma determinada linha ascendente , um determinado pensamento Nacional — é claro que com percalços . A partir de 2016 nós entramos num desvio : nós apagamos basicamente a estrutura do pensamento da maior parte da inteligência brasileira ”, lamenta Bahadian .
Adhemar Bahadian : “ Tudo que hoje estamos vendo nas decisões do governo em relação aos diretos humanos não é coincidência . É fruto da filosofia impressa na Emenda dos gastos públicos ”.
A armadilha da Emenda do Teto dos Gastos
Para Adhemar Bahadian , não é possível desvincular o desmonte da política externa brasileira e a crise econômica atual da Emenda Constitucional 95 , aprovada em 2016 a partir da Proposta de Emenda à Constituição ( PEC ) conhecida como “ teto dos gastos ”.
“ Não se tratou de uma medida de caráter transitório ou de readequação de demanda e oferta , como foi vendida . A Emenda foi uma maneira artificial , sub-reptícia , de romper , mais uma vez , com os princípios básicos da Constituição de 1988 , fundamentalmente os relacionados aos direitos sociais , aos direitos econômicos e aos direitos humanos ”,
explica . “ Tudo aquilo que hoje nós estamos vendo no comportamento aparentemente abúlico do governo no que toca os diretos humanos , a educação e a saúde , não é uma coincidência . É fruto da filosofia impressa na Emenda dos gastos públicos , só que ela não é colocada de maneira transparente para a sociedade brasileira ”, questiona Bahadian .
Para o diplomata , quando o equilíbrio fiscal é colocado como justificativa de cortes , coloca-se em funcionamento o mecanismo que corrói os princípios de direitos da Constituição . “ Nós temos que honrar a Constituição . Ela não é um bloco de papel que a cada dia você pode mudar ”, defende ele , citando os preceitos que regem o espírito da Carta Magna .
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