Jornal do Clube de Engenharia 575 (Fevereiro de 2017) | Page 8

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A Base de Alcântara e a nossa soberania

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“ Nós não sabemos , não sabe a sociedade nem o Congresso , os termos da retomada das negociações , pois elas estão sendo levadas a cabo em segredo ”, adverte o cientista político Roberto Amaral , que estava à frente do Ministério de Ciência e Tecnologia entre 2003 e 2004 . Na ocasião , uma primeira versão de acordo para uso da base pelos americanos foi retirada do Congresso Nacional , após os termos acertados ainda na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso terem sido considerados “ lesivos à soberania nacional ” pela Câmara dos Deputados ao aprovar parecer elaborado pelo deputado Waldir Pires . Coube ao chanceler Celso Amorim comunicar ao governo americano que o assunto estava encerrado .
Por isso , a volta dessa discussão preocupa Roberto Amaral . “ Tememos todos , pois o precedente é grave . Os termos do acordo firmado no governo FHC eram antinacionais e lesivos à soberania nacional ” ( ver quadro ).
Posição estratégica
A Base está localizada na península de Alcântara , no Maranhão , e é operada pela Agência Espacial Brasileira . Entre suas principais vantagens constam a facilidade do acesso aéreo e marítimo , a baixa densidade populacional e a proximidade da Linha do Equador , que representa economia de combustível no lançamento de satélites . Diz Amaral que os EUA têm interesse apenas em usar a Base como
se fosse deles , e o nosso espaço para lançamentos comerciais ou militares deles . O que ganhamos com isso ? questiona .”
Conjuntura mundial
A professora Nadine Borges , advogada que coordena a área de Relações Externas da Universidade Federal do Rio de Janeiro , lembra que os termos apresentados na primeira tentativa de acordo com os EUA impunham várias proibições ao Brasil . E autorizavam o desembarque de contingentes militares na base , com acesso exclusivo às suas instalações . “ A tecnologia e o conhecimento utilizados eram fechados , não poderiam ser conhecidos pelos brasileiros , e isso significaria alienar parte do nosso território ”, diz Nadine .
Ela destaca , ainda , o contexto geopolítico global , lembrando que a localização da base é adequada também para o lançamento de mísseis .
Outro problema , na avaliação da especialista , é a falta de divulgação das intenções governamentais . “ Não sabemos os objetivos do governo brasileiro , não sabemos os termos da proposta , nem o que está sendo negociado ”, afirma . “ A confirmação de que há uma negociação decorreu de vazamentos na imprensa , o que é preocupante também .” Embora o acordo tenha que passar pelo Congresso Nacional , teme-se que tramite sem tempo para debates e a participação da sociedade .
A poucos graus do Equador , a base de lançamento de foguetes de Alcântara é a que tem a melhor localização do mundo .
Roberto Amaral aponta a intenção deliberada dos EUA de impedir o Brasil de obter autonomia na área espacial . O ex-ministro se reporta a algumas , entre outras , das cláusulas críticas do acordo que se pretende ressuscitar : “ Previa a possibilidade de veto político ( sem necessidade de justificativa ) dos EUA a lançamentos , brasileiros ou não , a partir do Centro de Lançamento de Alcântara (…); proibia nosso país de cooperar ( entenda-se como tal aceitar ingresso de equipamentos , tecnologias , mão de obra ou recursos financeiros ) com países não membros do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis - Missile Techonology Control Regime ( MTCR ) - ( art . III , B ); proibia o Brasil de incorporar ao seu patrimônio ‘ quaisquer
equipamento ou tecnologia que tenham sido importados para apoiar Atividades de Lançamento ’ ( art . III , C ); proibia o Brasil de utilizar recursos decorrentes dos lançamentos no desenvolvimento de seus próprios lançadores ( art . III , E ); obrigava o Brasil a assinar novos acordos de salvaguardas com outros países , de modo a obstaculizar a cooperação tecnológica ( art . III , F ); proibia os participantes norteamericanos de prestarem qualquer assistência aos representantes brasileiros no concernente ao projeto , desenvolvimento , produção , operação , manutenção , modificação , aprimoramento , modernização ou reparo de Veículos de Lançamento , Espaçonaves e / ou Equipamentos Afins ( art . V , 1 ).”
Crédito : Paulo Rezende / FAB