INTERPRESS (Junho, 2019) | Page 33

O Golpe de 64 funcionava a câmera e a fotografia foi entran- Em 31 de março de 1964, um golpe de Es- do aos poucos na vida de Sebastião Salgado. tado conduzido pelo marechal Castelo Branco derrubou o presidente João Goulart e, com ele, a República. Um regime militar foi instalado e perdurou até a eleição de Tancredo Neves, em 1985. Houve um grande movimento contra a di- tadura e todas as violações de direitos humanos que foram infligidas. Sebastião e Lélia partici- param de inúmeras manifestações de resistên- cia à ditadura, sempre defendendo seus ideais. Após a conclusão do curso de Eco- Refugiados no campo de Korem, na Etiópia nomia, seguiu para São Paulo para come- (1984). Fonte: Sebastião Salgado çar o recém-inaugurado curso de mestra- Após concluir a pós-graduação, em do na Universidade de São Paulo (USP), 1971, entrou para a Organização Interna- onde se filiou a partidos e organizações po- cional do Café (OIC), em Londres. Tor- líticas de esquerda, tornando-se ativista. nou-se um economista respeitável e sua O Brasil se tornara um ambiente hostil situação financeira melhorou, alugando um demais para a dupla radical. A organização da bom apartamento de frente para o Hyde que faziam parte, decidiu então que deviam par- Park, e adquirindo um carro melhor. Fazia tir para a França, pátria dos direitos humanos e frequentes viagens a países africanos pela da democracia para estudar e retornar ao Bra- OIC com o objetivo de desenvolver pro- sil em tempos melhores e poder ajudar o país. jetos econômicos nessas regiões. Durante A descoberta da fotografia essas viagens descobriu que a fotografia - Chegaram em Paris em agosto de 69, sua paixão - representava melhor do que quando Sebastião ingressou no curso de dou- textos e estudos estatísticos a realidade torado na Escola Nacional de Estatísticas Eco- econômica de diversos locais do mundo. nômicas, enquanto Lélia cursava arquitetura na A decisão que mudou sua vida Escola de Belas Artes de Paris. Sebastião tra- Em seu livro, Da minha terra à terra, balhava como descarregador; Lélia, bibliotecá- Sebastião conta que passava longas tardes de ria. Juntaram dinheiro e puderam comprar um domingo em um barco no Serpentine, o lago carro, com o qual viajaram por toda a França. do Hyde Park, discutindo por longas horas Durante viagens pela Europa, passaram com Lélia sobre seu desejo de trocar a Eco- por Genebra, na Suíça, onde se encontravam nomia pela fotografia; e assim fez! Aban- os melhores materiais fotográficos: Lélia, na donou a próspera carreira de economista, faculdade de arquitetura, precisava de uma incluindo a promissora proposta para traba- câmera para fotografar prédios. Não sabiam lhar no maior e mais conhecido banco de de- nada de fotografia, mas logo de cara se encan- senvolvimento do mundo, o Banco Mundial, taram com o objeto. Juntos, descobriram como em Washington, para se tornar fotógrafo. 33