Hatari! Revista de Cinema #05 Ficção Científica | Page 55

A revolta dos oprimidos mostra o interesse pela liberdade . “ Liberdade - essa palavra , que o sonho humano alimenta : que não há ninguém que explique , e ninguém que não entenda ” ( Cecília Meireles , Romanceiro da Inconfidência , 1953 ) é a fonte de empatia que coloca em dúvida a missão dos dois astronautas . Em Blade Runner , os Replicantes se ajudam mútua e emocionalmente para salvar suas vidas enquanto os humanos matam uns aos outros . O próprio personagem de Harrison Ford tem dúvidas de sua origem , entre ser Replicante ou um humano ( o filme não deixa claro ). Já Dimas Cravalanças , o astronauta de Branco Sai , Preto Fica , apesar de também negro , é membro do Estado brasileiro no futuro de onde veio , o mesmo Estado brasileiro que amputou Sartana e Marquim , mas em contato com eles , reflete sobre o direito à vingança e ao protagonismo na ação contra o opressor . Este sentimento é resignificado na singela música de Roberto Carlos cantarolada pelo Astronauta em dado momento do filme : “ De hoje em diante / Vou modificar o meu modo de vida / (...) Cansei de esperar / De esperar enfim / E pra começar eu só vou gostar de quem gosta de mim ”.
No meio de Branco Sai , Preto Fica , os protagonistas registram o áudio de uma banda local que fará parte da “ Bomba Cultural ”. Insatisfeito , Marquim pede às backing vocals que , sentadas durante a gravação , se levantem para cantar como num show . Essa vontade de preencher o vazio é o diferencial , pois é o modo de tratar as contradições do fazer fílmico dentro do próprio filme . Os cenários de Branco Sai , Preto Fica são compostos a partir da movimentação das personagens e apenas com luzes diegéticas . Os planos longos , a montagem que por vezes parece amputada , o descompromisso com a continuidade e o uso de atores naturais e moradores de Ceilândia demonstra o interesse em fazer o cinema acima da lógica de mercado . O final de Blade Runner foi modificado por produtores , a contragosto do diretor , para atingir o grande público ( a versão “ Director ’ s Cut ” saiu apenas dez anos depois ).
Outra dualidade em Branco Sai , Preto Fica é a afirmação territorial , pois mesmo com a participação de alguns músicos locais , a base da trilha sonora é de canções estrangeiras , as mesmas do baile black que gerou a trama . Isso reforça o ideal de não fugir do passado mas não relembrá-lo com puro saudosismo , além de abrir portas para o futuro ,
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