Fluir nº 8 - Novembro 2021 | Page 42

42 prejudicar uma língua que , como argumentariam os seus defensores , se quer dinâmica ?

O Acordo Ortográfico de 1990 foi uma proposta deficientemente concebida e mal-enjorcada , mas que satisfez , e continua a satisfazer , os políticos na sua ânsia transatlântica . O AO é um produto intrinsecamente ideológico , um grande malentendido . Infelizmente , a nossa classe linguística desistiu de denunciá-lo . Submete-se-lhe , mesmo sem nunca o defender , ou apontar-lhe qualquer vantagem . Entretanto , os políticos rejubilam com o brinquedo . E , enquanto eles assim se mantiverem entretidos , não há hipótese de nos livrarmos dele .
F7 - A sua página de Facebook é um afiadíssimo veículo de discussões e troca de ideias , sobre a língua e modos de falar , mas não só . Desde a aceitação do uso do « você », ou dos estrangeirismos , até aos excessos do « politicamente correcto », o senhor foi pondo o dedo em feridas , criando admiradores e inimigos . Como avalia essa experiência ? O que lhe traz um meio com tantos ( ou tão apregoados ) perigos ?
Começo logo por aí : o Facebook esconde vários perigos . No caso concreto ( outros dizem " no caso específico ", à inglesa ), os desafios linguísticos que ali lanço fazem-me , não raro , deitar as mãos à cabeça , arrependido de os ter suscitado .
Provavelmente o erro está em mim . Suponho ir criar curiosidade por este ou aquele fenómeno do idioma , mas apercebo-me de que o grosso dos comentadores não o capta . O Facebook funciona bem em níveis primários , instintivos , os do ameno apreço ou do aberto desapreço . Não se presta ao raciocínio , à surpresa , à admiração , que só no contacto directo se conseguem . Este contacto dáse em comunicações e debates ao vivo na internet , no Zoom ou outras plataformas , a que antevejo um grande futuro .
F8 - Uma pergunta delicada : em dado momento ( por causa talvez da influência de alguns linguistas na elaboração dos programas de Português para o Ensino Secundário ) difundiu-se a ideia de que a linguística , em Portugal , privilegiaria o ensino da língua em geral , remetendo para segundo plano o estudo da Literatura . Gostava de saber o que pensa disto o Professor . Em primeiro lugar , se se trata de uma falsa e injusta percepção ; por outro lado , qual deve ser o papel e a importância do estudo dos clássicos , no ensino formal da Língua Portuguesa , ao longo do Secundário .
A minha longa ausência do país ( quase cinquenta anos ) privou-me do conhecimento directo de toda esta matéria . Além disso , os estudos secundários num seminário de há 60 anos nada iluminam ,