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Para além disso , vimos aparecer galerias de arte especializadas em banda desenhada , os jornais e as revistas concedem , doravante , um importante lugar à crítica das bandas desenhadas , as instituições culturais valorizam autores de banda desenhada ... Mas o que é igualmente notável , e é talvez aí que se cristaliza uma nova forma de desconfiança , é o entusiasmo generalizado por este medium e a sua eclosão nos domínios , por vezes , inesperados , como o da jardinagem ou o da cozinha , das disciplinas científicas ou das ciências humanas . O universo proteiforme e heterogéneo da banda desenhada constitui um dos seus interesses , mas talvez constitua igualmente um calcanhar de Aquiles , visto que ele dá origem a numerosas amálgamas e mal-entendidos . Quando falamos em banda desenhada , metemos tudo no mesmo saco : BD para crianças , BD para adultos , BD mainstream e BD independentes , etc . Esta falta de discernimento gera preconceitos , até uma certa desvalorização do género no seu todo . E a filosofia não é estrangeira a esta desconsideração que se desdobra , muitas das vezes , em desprezo . É certo que houve , e continua a haver , incursões da filosofia na banda desenhada , mas os filósofos permanecem hesitantes e privilegiam o caminho inverso . Seria preciso deixar o mundo da banda desenhada para se poder entrar na filosofia , saltar o mundo da infância para o dos adultos , da literatura fácil para os “ verdadeiros livros ”, do humor para o espírito dos sérios , as imagens para os conceitos , etc . Parece-me que a narrativa gráfica sequencial pode ser a ocasião de pôr o aprendiz da filosofia em disposições favoráveis ao questionamento , à problematização e à conceptualização , ou , para dizê-lo segundo a fórmula kantiana , à aprendizagem não d ' “ a filosofia ” enquanto história das doutrinas , mas d ' “ o filosofar ” como processo do pensamento .
Fluir - No teu entender , como é que a filosofia apresentada em forma de BD pode , efectivamente , ajudar os jovens a interessarem-se mais por esta matéria e a melhor integrarem as noções filosóficas no quotidiano ?
Existem várias abordagens possíveis ; algumas tiras bem escolhidas podem constituir a oportunidade de questionamentos . Basta pensar em ' Peanutz ', de Schulz . Quanto a mim , o que me pareceu interessante , no quadro da escrita destas bandas desenhadas filosóficas , foi o facto de brincarem com a sequencialidade e o desdobramento , o da narrativa gráfica , assim como o do pensamento filosófico . Contrariamente à imagem isolada , a banda desenhada convida à deambulação e a uma imersão prolongada num universo específico . Ao propor cenários de situações concretas ,