Fluir nº1 - Renascimentos - 2018
despertaDOR
Ana Marques
1. Fala-me do teu percurso como artista, até chegares a
esta escultura. O que te interessou, o que te influenciou,
o que te formou - e que outras obras criaste?
Nunca me considerei uma artista porque a minha
formação é em design de comunicação e tem sido nessa
área que mais tenho trabalhado paralelamente à minha
profissão na área do ensino. Estou em constante
produção, e grande parte do que faço é-o em regime de
voluntariado, por isso nem aparece com a minha
assinatura.
Nos últimos anos, porque estou envolvida num
projecto de doutoramento, dei um novo rumo à minha
actividade (extra-curricular). Tinha feito um mestrado
na área multimédia e continuo nesse caminho. Estava
nos últimos anos da licenciatura quando começou a era
informática, ainda sem fazer parte dos currículos, e foi a
minha curiosidade que me levou a descobrir e a querer
aprender sobre essa relação arte/computador, não sem
alguma resistência a aceitar a arte computacional, por
isso não explorei a programação, hoje com algum
lamento por essa opção. A obra com mais exposição
mediática foi a Arbor, precisamente por ter esse
componente que a diferencia de uma mera escultura: a
interactividade.
2. Detenhamo-nos no despertaDOR, exposto na Bienal
de Cerveira. O que é esta obra, na sua forma e no seu
conceito?
Sempre fui uma defensora de todas as vidas e em
particular as dos que não têm voz para se defender. Os
animais estão nesse grupo e por isso eu tinha de fazer
alguma coisa por eles, além de salvar o cão e o gato de
rua, vítima de abandono ou violência, tão comuns no
dia-a-dia. Eu, como a maior parte das pessoas, vivemos
uma vida sem perceber o dano que causamos aos
outros, sem ter noção de que a vida dos outros depende
de nós, dos nossos actos, das nossas opções. E cada um
de nós pode fazer a diferença. A mensagem é dura –
revela a dor que infligimos aos animais para satisfazer
prazeres de curta duração: o bife no prato, o
espectáculo acrobático no circo, a tourada, os sapatos
de pele, os testes em laboratório… São vidas inteiras
condenadas ao sofrimento e isso é completamente
absurdo no século XXI.
Foi isso que quis mostrar quando propus às minhas
colegas de projeto (o CADA, na escola) que devíamos
mostrar, através dos meios que temos, a realidade atrás
das jaulas, das grades – a realidade que 95% das pessoas
teimam em não ver. O despertaDOR nasceu na escola e
era uma peça analógica, tradicional. Depois alterei-o
numa peça autónoma, que pudesse viajar para qualquer
lugar onde pudesse passar a mensagem. Os cartazes de
papel transformaram-se em vídeos, para os quais
convidei alunos de 12º ano (agora alunos de faculdade)
a colaborar. O despertaDOR está neste momento a
transitar para a sua IV versão.
3. Como se distingue - será, sequer, fundamental
distinguir -, no despertaDOR, o manifesto eficaz, isto é,
um instrumento de intervenção, e a obra de Arte?
Os elementos de intervenção e a arte são indissociáveis.
Se assim não fosse, a arte não seria veículo de protesto,
de inconformidade, de rebelação (sei que é um erro,
substitui a palavra mas isto devia existir). É um
instrumento de intervenção sim, incomoda, alerta. Sua
intenção é fazer as pessoas pensar, sugerindo que se
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