“ Vivia com medo. Chorei muitas vezes na pista, porque não conseguia treinar com as dores. Terminava os treinos a chorar para um lado e o meu treinador chorava para o outro. Sabia que aquilo que acontecia nos treinos podia acontecer em competição, até porque a prova era muito mais difícil.”
ESPECIAL 40 ANOS
ABRIL 2025 REVISTA DRAGÕES
“ Vivia com medo. Chorei muitas vezes na pista, porque não conseguia treinar com as dores. Terminava os treinos a chorar para um lado e o meu treinador chorava para o outro. Sabia que aquilo que acontecia nos treinos podia acontecer em competição, até porque a prova era muito mais difícil.”
Nunca perdeu a esperança? Vivia com medo. Chorei muitas vezes na pista, porque não conseguia treinar com as dores. Terminava os treinos a chorar para um lado e o meu treinador chorava para o outro. Sabia que aquilo que acontecia nos treinos podia acontecer em competição, até porque a prova era muito mais difícil, mas a força de vontade também era muita. Sofri muito em 1996, foi um dos meus piores anos a nível de lesões. Claro que queria ganhar a medalha de ouro, mas corria sempre com receio. Fazia tratamentos à meianoite com o doutor Puga e não tinha descanso. Se alguma coisa corresse mal, pelo menos sabia que não era por falta de esforço, porque fiz tudo direitinho.
Em julho foi porta-estandarte de Portugal. Como foi esse dia? Sinto que consegui tudo o que podia conseguir e ainda mais. Ser portaestandarte foi uma das melhores coisas que me aconteceu. Levar a bandeira do meu país nos Jogos Olímpicos foi excelente e ainda tive a oportunidade de a levar mais uma vez na cerimónia de encerramento em Sydney, onde ganhei mais uma medalha.
2 de agosto de 1996. Tinha a prata garantida, mas foi buscar forças para ultrapassar a Wang Junxia a 200 metros do fim. Em que é que pensou? Acho que nem dá para pensar muito. Sabia que não tinha nada a perder, estava a ser muito rápida e tinha um sonho que só podia concretizar ali. Tinha visto que o segundo lugar estava garantido, mas olhei para o ecrã e vi que a chinesa estava em esforço. Agarrei-me ao que já tinha sofrido e sabia que não tinha nada a perder, comecei a aproximarme e a sentir mais confiança. Quando partimos de trás temos sempre mais força do que a pessoa que vai na frente e foi isso que aconteceu. Ultrapassei por dentro, pelo sítio errado, porque se ela me desse um toque e eu caísse a culpa seria minha, mas acho que ela nem se apercebeu que deixou aquele espaço para eu passar. Naquele momento já nem me lembrava se ia pela esquerda ou pela direita, porque ali é o tudo ou nada. Correu bem.
Qual é a sensação de ser campeã olímpica? É uma alegria enorme, porque foi aquilo com que sonhei a vida toda. Vi que estavam lá os meus colegas de seleção com bandeiras à minha espera e isso fez-me pensar nos portugueses que estavam a ver e, acima de tudo, na minha família. Só queria chegar a casa e estar com eles. Foi o momento mais importante da minha carreira e queria partilhá-lo com a minha família.
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