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e se extingue. É nesse novo contexto, que a pessoa humana passa a estar inserida.
Assim, como na realidade física, a pessoa nasce e morre, fenômenos análogos
ocorrem na realidade virtual. Muitas vezes estas realidades, física e virtual, são
assíncronas, pois, no ciberespaço, pode alguém “nascer” aos 30 (trinta) anos de idade;
e, outros, com estes mesmos anos, quem sabe sequer foram concebidos, no mundo
virtual, por sofrerem a exclusão digital. Ou, ainda mortos, que prosseguem a receber
homenagens. Por outro lado, existirão os que farão parte do mundo virtual, ainda no
ventre materno, sem sequer terem nascido, pelas fotos de ultrassonagrafia publicadas
em redes sociais por seus pais, ou mesmo, aqueles partícipes de projetos
implementados por seus genitores, que aparecerão nos primeiros 365 (trezentos e
sessenta e cinco) dias de sua existência, em redes sociais, nas telas dos computadores.
De qualquer sorte, assim como o nascimento é um fato da natureza (fato
jurídico stricto sensu) que, portanto, independe da vontade humana, o nascer para o
mundo virtual, hodiernamente, parece seguir a mesma tendência. Embora muitos
decidam ter uma conta em uma rede social, escolham participar deste ou daquele
serviço, ou seja, lá estão por um elemento volitivo, outros nascem virtualmente por
terem sido introjetados, sem qualquer comunicação ou autorização. Aliás, mesmo
resistentes, passarão a fazer parte do mundo virtual.
Dessa forma, é importante compreender que, ao longo da história, em razão da
evolução dos meios de comunicação, o conceito de corpo da pessoa humana passou
por modificações semânticas (Breton, 2012). Hodiernamente, o corpo a ser tutelado
não pode ser entendido apenas como um pedaço de carne, ou, um emaranhado de
células, deve, por outro lado, também se revelar como uma estruturação de dados que
representa virtualmente a pessoa humana, como se fosse um “avatar” (Doneda, 2006).
Na tela do computador, é possível desenhar o perfil desta pessoa, quando se
depreende preferências políticas, religião, gostos, status de relacionamento (Bauman;
May, 2010). Stefano Rodotà dá a esta denominação “corpo elettronico” (Rodotà,
2013, p. 16), tratando-se da reunião de informações que se referem a um sujeito, que
reflete construção de sua identidade. Nesse diapasão, o imenso fluxo de dados traça
uma nova concepção de identidade (Lasica, 2009), sendo que “noi siamo la nostra
stessa informazione” (Floridi, 2011).
É nesse caminho que os direitos de personalidade, e, sobretudo, o direito de
privacidade, devem tutelar a pessoa humana, não podendo se restringir ao corpo
físico, mas estender-se à sua dimensão virtual. No caso, a soberania sobre o corpo
também se reflete no direito de acesso ou não a banco de dados. A tutela, portanto,
vai além do corpo físico, protegendo o corpo eletrônico (Rodotà, 2010). Neste
sentido, assim como existem leis que tutelam cuidadosamente a disposição acerca de
órgãos do corpo humano, de igual forma, os tecidos trançados pelos dados de um
sujeito, que de sua combinação poderão formar uma resultante que comunica
informações importantes, e, inclusive, sensíveis, são merecedores de proteção do
Direito.
Em sendo assim, há qu ser feita uma releitura da tutela jurídica sobre o corpo.
Preteritamente, já se enfrentou questão semelhante, quando, em 1890, em face da
utilização de máquinas fotográficas instantâneas, Brandeis e Warren trataram acerca
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